A Feira do Livro de Lisboa, inaugurada em 4 de junho e que se estende até dia 22 deste mês, completa em 2025 a sua 95ª edição, impressionante marca de longevidade.

Tem menor apelo global que as feiras literárias de Frankfurt ou Bolonha, mas apresenta grande relevância no espaço português, sendo uma espécie de ponte cultural entre lusofonia e Europa. Seus números são superlativos: 350 pavilhões com 963 marcas editoriais e mais de 85 mil títulos, 7 praças temáticas e diversos espaços para restauração e food trucks espalhados pelo Parque.

Circulo pela Feira evitando tentações – minha bagagem já está muito pesada e em três dias sigo para o Brasil, onde vou resolver pendências e também mergulhar em dois outros eventos dedicados à leitura: a Bienal do Livro no Rio de Janeiro, de 13 a 22 de junho, que celebra o Rio como a Capital Mundial do Livro em 2025, título concedido pela UNESCO e, mais adiante, a 23ª. edição da Flip – Festa Literária Internacional de Paraty, cidade histórica estrategicamente situada entre Rio e São Paulo, de 30 de julho a 3 de agosto, este ano homenageando o poeta Paulo Leminski. Se na Bienal e na Feira de Lisboa eu passeio como leitor anônimo, na Flip vou a trabalho, como autor, lançando dois livros com a Editora Caravana, mas falarei disso mais à frente.

E hoje, ao escrever esta resenha, cansado do domingo na Bienal do Livro em meio à frenética multidão de visitantes, posso ensaiar uma comparação entre o circuito de leitura dos dois países, a partir desses eventos.

É fácil constatar que a Bienal do Rio é maior em escala, um megaevento com foco em vendas e em lançamentos de best-sellers (mesmo que entre os mais vendidos estejam livros para colorir, não para ler) e que se transformou em um acontecimento para as massas, com ampla cobertura e patrocínio da mídia. Enquanto isso, Lisboa consegue equilibrar bancas de livros e boas promoções com atividades culturais, palestras e debates, atraindo famílias e grupos de turistas, e lá pude bisbilhotar e ver leitores metódicos, que portam suas wish-lists e saem com os livros que alimentarão sua leitura até a feira do próximo ano.

Com base em dados recentes, Portugal apresenta indicadores de leitura mais robustos – percentual de leitores: 73% da população, com média anual de 5,6 livros por leitor – que o Brasil (onde leitores são somente 47% da população e a média anual é de 4,8 livros por leitor), embora certamente ambos os países enfrentem desafios.

O Brasil passa por uma crise estrutural na educação, que se reflete na crise da leitura, exposta na queda alarmante nos índices dos últimos anos: 53% não leram nenhum livro (mesmo que parcialmente) nos últimos 3 meses (2024), o pior índice da série histórica desde 2007. O que se agrava ao consultarmos as estatísticas brasileiras de analfabetos (9,1 milhões, mais que a população total de um país como a Áustria) e de analfabetos funcionais (impressionantes 29% da população brasileira entre 15 e 64 anos que “conseguem ler, mas não entendem totalmente o que leem”).

Quanto a Portugal, o país ainda se encontra em forte desvantagem no ranking europeu (dados da Eurostat em 2024 sobre europeus que não leram um único livro no período de 12 meses): é o 5º país entre os que menos leem (41,9%), superando neste indicador apenas a Bulgária, Itália (35,4%), Chipre (33,1%) e Romênia (29,5%). O maior desafio para o país é reverter a forte queda na leitura entre adultos e idosos, uma vez que já são implantadas políticas, como o cheque-livro, para incentivar os jovens à leitura.

Finalmente, cabe ressaltar que, face ao porte dos dois países, Portugal apresenta um mercado editorial relativamente pequeno (13 milhões de livros vendidos em 2023), enquanto que no Brasil os números absolutos são maiores, venda de 55 milhões de exemplares (2023), mas estão bem aquém do enorme potencial de um país de 212 milhões de habitantes.

Separados por um oceano, Portugal e Brasil têm a uni-los a origem comum e a heranças culturais, compartilhadas com todas as nações da CPLP, a Comunidade dos Países de Língua Portuguesa. Podemos viajar em sonhos e imaginar que estes rios de livros que vejo no Parque Eduardo VII e no Riocentro possam se mesclar em um caudaloso oceano de livros que consiga unir mais ainda, pela leitura e sua capacidade de criar utopias, estes nossos países!

Serviço:

Feira do Livro de Lisboa – Parque Eduardo VII, de 4 a 22 de junho de 2025

Bienal do Livro do Rio de Janeiro – Riocentro, de 13 a 22 de junho de 2025

FLIP – Paraty, estado do Rio de Janeiro, de 30 de julho a 3 de agosto de 2025