A falta de regulamentação específica para o lobbying em Portugal tem sido apontada como um fator de risco para a transparência e integridade dos processos de tomada de decisão governamental.

 

A ausência de um quadro legal claro pode levar a interpretações errôneas das ações de indivíduos que mantêm relações com o poder político, como é o caso de Lacerda Machado, que se viu envolvido em suspeitas de tráfico de influências devido à sua proximidade com o Primeiro-Ministro António Costa.

As investigações do Ministério Público aos negócios do lítio e do hidrogénio, e as suspeitas em torno do data center de Sines, não são apenas um reflexo da relação entre o público e o privado, mas também um espelho da carência de medidas legislativas que delimitem e regulamentem as práticas de lobbying. Estas práticas, quando não enquadradas legalmente, podem afetar negativamente a percepção pública sobre a integridade das decisões políticas e inibir o investimento, criando uma atmosfera de desconfiança e insegurança jurídica.

O caso de Lacerda Machado evidencia a necessidade premente de Portugal avançar na direção de uma legislação robusta e transparente que regule o lobbying. Tal medida não só fortaleceria o tecido democrático, como também preservaria a integridade dos processos de decisão e restauraria a confiança dos cidadãos nas instituições. A implementação de um regime de lobbying é, por isso mesmo, um passo decisivo para garantir que a influência exercida nos corredores do poder seja não só legítima e ética, mas também claramente definida e monitorizada, assegurando que a voz do povo permaneça sempre a mais alta na sala.


O lobby é uma prática que, quando inserida num contexto de transparência e regulamentação adequada, pode beneficiar a democracia, promovendo uma comunicação eficaz entre os representantes da sociedade civil e os decisores políticos. Na Europa e nos Estados Unidos, a regulamentação do lobby tem como objetivo principal a promoção da transparência e a minimização da influência clandestina nos processos governamentais.

Na Europa, 29 países já possuem leis de lobby que buscam estabelecer uma cultura de transparência e representação de interesses de forma ética. Um exemplo disto é o registo de transparência obrigatório da União Europeia, que reforça a cultura de transparência comum e estabelece elevados padrões de representação de interesses transparente e ética. Esta regulamentação é considerada uma parte integrante e importante do processo de tomada de decisão da UE, melhorando ano após ano e com um número crescente de lobistas

O relatório da Transparency International examina a prática do lobby e as tentativas de regulamentação em 19 países europeus e nas três principais instituições da UE, destacando que a regulamentação pode ajudar a restaurar a confiança do público no governo, que está historicamente baixa devido à associação do lobby com segredos e vantagens injustas

Estes exemplos mostram como a regulamentação do lobby pode servir como uma ferramenta para garantir que a influência exercida sobre os decisores políticos seja não só visível e previsível, mas também responsável e alinhada com os interesses públicos. Ao enquadrar legal e politicamente o lobby, os governos podem assegurar que o diálogo entre o setor privado e os formuladores de políticas ocorra de maneira justa e aberta, permitindo que todas as vozes sejam ouvidas e consideradas no processo democrático.

A falta de regulamentação apropriada do lobbying em Portugal representa vários inconvenientes para as instituições, a sociedade e os próprios indivíduos que exercem a atividade. Sem leis claras, o lobbying pode conduzir a uma cultura de influências opacas e conflitos de interesses, afetando a qualidade da legislação, que pode ser influenciada por ideologias partidárias e poder parlamentar sem a devida transparência.

Este vazio legislativo também cria insegurança nos investidores, pois não há garantias claras de que os processos de decisão sejam justos ou livres de influências indevidas. Isso pode atuar como um entrave ao desenvolvimento económico, pois a incerteza jurídica e a falta de transparência desencorajam o investimento

Para os profissionais que exercem o lobbying, a ausência de um quadro legal claro pode resultar numa perceção negativa da sua atividade, associando-a injustamente a práticas não éticas ou mesmo ilegais. Além disso, um relatório do Parlamento Português destacou que o país possui apenas 23% do grau de proteção do sistema contra o lobby indevido, evidenciando o risco de influência imprópria sobre a política e a governação.

Assim, a falta de regulamentação não só mina a integridade das instituições democráticas, como também prejudica o tecido social e económico ao promover um ambiente de desconfiança e ao limitar a atuação transparente e ética de lobistas e decisores políticos.

 

Citamos aqui alguns casos  de países europeus onde o lobby é regulamentado legalmente, juntamente com alguns detalhes sobre as suas legislações específicas:

Reino Unido: Adotou o Registro de Consultores de Lobby em 2014. Este registro exige que os consultores de lobby se inscrevam e reportem seus clientes trimestralmente .
Irlanda: Em 2015, estabeleceu um registro de lobbying e requisitos de relatório para lobistas sobre suas atividades, clientes e os assuntos abordados .
França: Implementou uma legislação de transparência em 2016, que inclui a criação de um registro digital para lobistas e requer a divulgação de informações detalhadas sobre suas atividades .
Áustria: Tem um registro de lobby desde 2013, que exige que as organizações de lobby declarem seus clientes e o montante gasto em atividades de lobby .
Lituânia: Em 2001, foi um dos primeiros países a regular o lobby com a adoção de um ato de lobby que define quem é considerado lobista e as regras de conduta .
Polónia: Em 2006, adotou a Lei de Atividades de Lobbying que inclui a necessidade de registro para lobistas e reporte de suas atividades .
Holanda: Desde 2012, possui um registro de lobby voluntário e público para a Câmara dos Representantes, mas a estrutura de regulamentação é considerada limitada .
Eslovénia: Os funcionários públicos e as pessoas eleitas continuam a melhorar as disposições sobre o lobby, sendo obrigados a reportar contatos com lobistas .
Espanha: Está discutindo legislação sobre o lobby e a criação de um registro de transparência estava programada para 2022, mas até o momento o lobby não está regulado no nível nacional .
Suécia: O lobby permanece não regulamentado e não há obrigações específicas para que os tomadores de decisão revelem proativamente contatos com representantes de interesses .
Portugal: Está em curso esforços para passar nova legislação regulando atividades de lobby, com projetos de lei apresentados para emendar as regras propostas após o veto presidencial em 2019 .

Esta lista não pretende ser exaustiva mas trazer para reflexão dos nossos leitores e amigos, sendo que,   as informações estão em constante evolução à medida que novas legislações são propostas e aprovadas.


Morgado Jr.

 

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