Começou como um boato. Evoluiu para fake news. Ganhou contornos de fábula política. Daquelas histórias que, pela força narrativa, quase mereciam ser verdadeiras.

Tudo terá nascido na sequência de um discurso do atual líder do PSD, Luís Montenegro, no qual negou ter beneficiado de apoios de antigos Presidentes da República oriundos do seu próprio partido. A partir daí, o enredo ganhou vida própria — e duas “bombas” passaram a circular nos corredores do poder e nos mentideros partidários.

A primeira, explosiva no plano simbólico, surgiu numa alegada nota da Presidência da República, onde Marcelo Rebelo de Sousa declararia um corte oficial de relações institucionais com o Primeiro-Ministro. Um gesto grave, dramático, quase shakespeariano — e precisamente por isso irresistível para quem vive da intriga política.

A segunda “bomba” teria sido lançada por Aníbal Cavaco Silva, à saída de uma reunião nas instalações da Opus Dei. Segundo a narrativa que corre, o ex-Presidente afirmou estar profundamente magoado com um Primeiro-Ministro que, no seu entender, não reconhece nem respeita quem lhe estendeu a mão. Rematando com uma frase que ficou para a crónica: “não há mais mãozinha para nada”.

Nos bastidores do PSD, diz-se — sempre se diz — que estas maçonarices de bastidor ainda acabarão por empurrar Montenegro para uma quarta eleição antecipada… feita à medida da derrota. Verdade ou folclore? Pouco importa quando a política se alimenta tanto da perceção como da realidade.

Entretanto, Pedro Nuno Santos, ao sair de um Maserati que parece provocar mais inveja do que debate político sério, foi questionado sobre estas “bombas”. Olhou para o carro e respondeu, com ironia desarmante: “prefiro esta bomba”.

E talvez aí esteja a tragédia maior. Porque foi precisamente esse Maserati — símbolo fácil, populismo barato — que lhe custou as eleições. E, quem sabe, que nos custou a todos um Primeiro-Ministro que poderia ter sido.

O resto é ruído. Invejinhas de gente pequenina. A mesma gente que gosta de esquecer que Francisco Sá Carneiro — Francisco Manuel Lumbrales de Sá Carneiro — era, sem complexos, de classe alta. Alta, alta. E nunca precisou de esconder isso para liderar.

Como escreveu George Orwell, “num tempo de engano universal, dizer a verdade torna-se um ato revolucionário”. O problema é que, na política portuguesa, já nem sabemos bem onde acaba o engano… e onde começa a fábula.