Em Portugal, que é reconhecido pela excelência e abundância de seus profissionais de saúde, encontramos um paradoxo que desafia a lógica: embora seja o segundo país da UE com o maior número de médicos por 100 mil habitantes, paradoxalmente enfrenta uma crise de falta de médicos.

Recentes restrições implementadas no Hospital Beatriz Ângelo, em Loures, e no Hospital de Cascais mostram que a questão da obstetrícia nos hospitais é particularmente preocupante.

O impacto evidente desta crise pode ser visto na realidade do Hospital Beatriz Ângelo, onde as grávidas transportadas por ambulâncias estão temporariamente sem recepção. Maria João Tiago, secretária regional de Lisboa e Vale do Tejo do Sindicato Independente dos Médicos (SIM), disse que a medida, que durou até as primeiras horas de uma segunda-feira, foi justificada pela insuficiência de profissionais médicos. As grávidas apenas podem ser atendidas por "equipas mínimas" no serviço, o que mostra os problemas com o acesso aos cuidados de saúde.

Este não é o único exemplo. Além disso, outras unidades de saúde, como o serviço de urgência de obstetrícia do Hospital de Cascais, foram submetidas a restrições semelhantes, embora fossem temporárias. A pergunta mais importante é como um país com uma grande quantidade de médicos (que só foi superada pela Grécia na UE em 2021) pode se encontrar nesta situação?

Parece que não é a quantidade, mas a distribuição e as condições de trabalho que o Sistema Nacional de Saúde (SNS) oferece a resposta. Maria João Tiago diz que o principal problema é a falta de atratividade do SNS, o que leva os médicos a migrar para o setor privado ou para o estrangeiro em busca de melhores condições de trabalho e salários. Este fenômeno mostra que há uma crise na gestão de recursos humanos no setor da saúde e levanta questões sobre a durabilidade e a equidade do acesso à saúde em Portugal.

Os decisores políticos e as entidades gestoras do SNS devem analisar a situação de forma profunda e imediata. Para resolver esse paradoxo, são necessárias reformas nas condições de trabalho, uma reavaliação dos incentivos para a retenção de talentos e uma redistribuição equitativa de recursos. A única maneira de garantir que todos os cidadãos tenham acesso ao cuidado médico que precisam, quando precisam, é adotar uma abordagem holística e integrada que reconheça e valorize o capital humano como a base do sistema de saúde.

Assim, a realidade complexa nos coloca em dúvida sobre o significado que atribuímos à saúde e ao bem-estar coletivo. Portugal enfrenta dificuldades que vão além da contabilidade de médicos por habitante. É um apelo à ação para garantir que a riqueza em recursos humanos resulte em saúde de qualidade e acessível para todos. Em última análise, mostra como somos capazes de dar a nossa saúde, o bem mais valioso que temos, prioridade.

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Foto de destaque: IA; imagem ilustrativa que capta o paradoxo do sistema de saúde em Portugal, destacando tanto a excelência dos profissionais de saúde quanto os desafios estruturais que limitam o acesso a cuidados médicos adequados.