Numa entrevista envolvente, Lima partilhou como a equipa combinou técnicas de neurociência e psicologia experimental para explorar a plasticidade cerebral e a transferência de aprendizagem, tendo a música como modelo.
"É fundamental perceber se a aprendizagem de um instrumento musical pode induzir alterações no cérebro que se traduzam em competências além das musicais, como o reconhecimento de emoções nas expressões dos outros," afirma Lima. No entanto, os resultados vão contra algumas expectativas comuns, questionando ideias populares, como o famoso "Efeito Mozart", que sugere que a música torna as pessoas mais inteligentes.
A investigação confirmou que a prática musical melhora tarefas diretamente relacionadas, como a audição e o controlo motor – o que os especialistas chamam de "transferência próxima". Mas os efeitos em áreas mais distantes, como a linguagem e competências socioemocionais, são mais limitados do que muitos poderiam imaginar. “É uma conclusão que vai contra a corrente,” confessa Lima. “Os efeitos de transferência são menores do que inicialmente supúnhamos, parecendo restringir-se a tarefas diretamente ligadas ao que é treinado.”
Mais do que simplesmente clarificar a questão da plasticidade, o projeto levantou novas questões intrigantes: será que as aptidões musicais influenciam naturalmente outras competências, como a capacidade de identificar emoções pelo tom de voz, mesmo sem treino musical? E até que ponto a genética pode desempenhar um papel na predisposição para a aprendizagem musical?
Os resultados sugerem que a relação entre treino musical e desenvolvimento cognitivo pode não ser simplesmente de causa e efeito, mas estar associada a predisposições naturais. “Estudos feitos com gémeos demonstram que a componente hereditária da musicalidade é significativa, podendo chegar até 80%,” explica Lima. Isto sugere que tanto a propensão para aprender música como o tempo que alguém dedica à prática podem ter uma base genética sólida.
Este conhecimento, embora desafiante, abre novas possibilidades para compreender como a música está organizada no cérebro e de que forma se relaciona com outras funções cognitivas. O projeto MUSE, apoiado por uma equipa internacional de especialistas, trouxe uma nova luz a esta complexa interligação, ajudando a desmistificar algumas crenças antigas e reformulando a forma como compreendemos o impacto da música no desenvolvimento humano.
Para César Lima e a sua equipa, o final deste projeto é apenas o início de uma nova jornada. “Os projetos de investigação geram mais perguntas do que respostas, e isso é um aspeto positivo,” afirma o professor. O futuro da investigação passa por explorar mais a fundo a ligação entre a música e outras competências extramusicais, compreendendo melhor o que realmente acontece no cérebro antes e depois de alguém aprender a tocar um instrumento. Será que uma pessoa naturalmente mais musical tem vantagens em ambientes ruidosos? Ou melhores capacidades de comunicação e empatia?
A complexidade do cérebro humano e a sua ligação à música continuam a ser um desafio para os cientistas, e projetos como o MUSE são fundamentais para desvendar os limites e potencialidades desta relação fascinante.
Para ler a entrevista completa com o Professor César Lima, aceda ao link:
[Entrevista Original] https://www.iscte-iul.pt/magazine/artigo/61