O ponto alto da celebração foi a reintegração ao patrimônio do Palácio da Planalto, sede do Poder Executivo, de 21 obras de arte danificadas pelos facínoras e nesse ínterim restauradas. Em particular, vale citar o belíssimo relógio de pêndulo do século 17, recebido de presente da corte francesa por D. João VI, derrubado de seu pedestal a pauladas; uma ânfora de cerâmica esmaltada de origem italiana, estilhaçado em 168 pedaços, a pontapés e golpes de varas, e o famoso painel de nosso maior pintor modernista, Di Cavalcanti, intitulado “As mulatas”, que foi rasgado a faca.
Presente à solenidade, o embaixador suíço Pietro Lazzeri, destacando a amizade suíço-brasileira, falou sobre o trabalho de restauração, da importância da manutenção do património cultural e histórico dos países e povos, da alta complexidade e mais de mil horas que demandou o trabalho, com a mobilização de profissionais de diversas áreas, sem custo para o Brasil. A restauração ficou a cargo da relojoaria Aldemars Piguet, criada em 1875, que arcou com os custos de materiais e mão de obra. Ficou perfeita e o relógio foi recolocado na mesa em que sempre esteve, também restaurada.
A solenidade oficial aconteceu no Salão Nobre do Palácio do Planalto e teve a participação de representantes de todos os poderes: Senado, Câmara Federal, STF, comandantes das três forças armadas, Exército, Aeronáutica e Marinha, ministros, deputados, senadores, governadores e outras autoridades. Entre os oradores, registramos as palavras de Janja, esposa de Lula, da Reitora da Universidade Federal de Pelotas, da Ministra da Cultura Margarete Menezes, do Ministro da Justiça Ricardo Lewandovski, do Ministro Edson Fachin, pelo STF, dos representantes da Câmara e do Senado, Maria do Rosário e Veneziano Vital do Rêgo, entre outros.
Quanto ao restauro das demais obras, lembremos que foi criado um laboratório especial, dentro do Palácio da Alvorada, residência oficial do Presidente da República, chefiado por profissionais especializados da Universidade Federal de Pelotas, Rio Grande do Sul (presentes à solenidade), após um convênio assinado com o Instituto do Patrimônio Artístico e Histórico Nacional (IPHAN). Estima-se que somente tal trabalho custou aos cofres públicos mais de 2 milhões de reais, que sertão cobrados, inapelavelmente, dos participantes daquele ato de selvageria e golpismo antidemocrático.
A solenidade prosseguiu com o descerramento do imenso painel As Mulatas, de Di Cavalcanti, totalmente restaurado, que voltou à parede original, onde sempre esteve.
Por último, aconteceu a inovadora solenidade de “abraço da democracia”, na qual as autoridades, ao lado do Presidente Lula e sua esposa Janja, desceram a rampa do Palácio e cercaram a palavra DEMOCRACIA, plantada como um jardim florido na Praça dos Três Poderes, quando então se deu o simbólico abraço, todos de mãos dadas, num acontecimento inesquecível, para ficar gravado na história da luta pela liberdade e a democracia no Brasil.
Um dos aspectos mais sintomáticos daquele ato de violência e terror contra a democracia no 8 de janeiro de 2023, foi a destruição das obras de arte encontradas no local. Ficou claro o recado: “somos contra a cultura e a arte”. Houvera uma biblioteca no Palácio e teriam indubitavelmente incendiado. Sabe a extrema direita que a cultura e a arte são sustentáculos maiores dos regimes democráticos: para destruir estes é preciso antes destruir aqueles. Não foi o que Hitler patrocinou através de seu Ministro da Propaganda, Joseph Goebels? Destruindo obras de arte e queimando livros? Então este era o caminho que deveria ser seguido. Se tivesse dado certo, não sabemos o que seria hoje dos nossos museus, bibliotecas e acervos culturais de todos os tipos.
A vandalização não se limitou às três peças citadas, que consideramos as mais importantes. Atingiu, no total, 21 obras de arte, incluindo esculturas e pinturas. Entre elas, vale lembrar a escultura O flautista, de Bruno Giorgi, a escultura Vênus Apocalíptica Fragmentando-se, de Marta Minujin , um Retrato de Duque de Caxias, de Osvaldo Teixeira, uma pintura de Frans Krajcberg, 5 pinturas de Glênio Bianchetti e diversas outras obras de valor inestimável.
E é essa gente asquerosa que, covardemente, guiada por parlamentares indignos do cargo, reivindica “anistia” para os seus atos atrozes. Na sua infâmia, continuarão destilando ódio e violência. Mas o povo responderá sempre, como lembrou Lula: “Ainda estamos aqui” para impedí-los!
Que ninguém se engane: um dos objetivos primordiais de todos os fascistas é destruir a cultura e a arte do seu país, como preliminar de medidas muito mais duras e violentas e o controle total do poder. Eis porque estão bufando de ódio com a vitória de nossa querida atriz Fernanda Torres no Globo de Ouro, na sequência do enorme sucesso do filme de Walter Salles, Ainda estou aqui, que conta a história de Eunice Paiva, esposa de Rubens Paiva, assassinado por facínoras do exército nas dependências do DOI-Codi no Rio de Janeiro, em 1971.
Um dos momentos mais emocionantes da solenidade de “abraço à democracia” foi quando o Presidente Lula, em seu discurso, citou o nome do filme: “Ainda estou aqui”, ao insistir no fato de continuarmos na luta pela liberdade e pela democracia. Foi aplaudidíssimo! E também quando assinou Decreto criando o PRÊMIO EUNICE PAIVA, a ser outorgado anualmente a quem se destacar na defesa da democracia, da Constituição e do Estado de Direito.
Não é à-toa que “Sem anistia para golpistas”, é a palavra de ordem que comanda hoje o sentimento dos brasileiros.
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Paulo Martins
Editor cultural