Continua Victor a nos falar sobre Suzana e seu trabalho: “suas pinturas e desenhos são, por exemplo, espécies de traduções visuais realizadas a partir da pesquisa da artista em torno da ideia do infinito”, e é uma amostra deste infinito que veremos no espaço da galeria, no Centro Histórico de Cascais: significativo conjunto de trabalhos inéditos, incluindo pinturas, desenhos, objetos e um livro-obra.

E Victor nos antecipa mais sobre este livro-obra, “Tábula”: “a artista realiza intervenções na forma de desenhos no interior de uma coleção de livros em fascículos encadernados que, originalmente, continham ilustrações de mapas antigos. ‘Todo mapa é uma ficção’, parecem nos sussurrar os desenhos de Queiroga, assim como as páginas deste livro, embebidas em tinta e em matéria artística”. 

Conheci Suzana e seu trabalho nos já distantes anos 1980, na Escola de Artes Visuais do Parque Lage, no Rio de Janeiro. A artista participou da movimentação artística brasileira no que foi visto pela crítica “o retorno da pintura” – em sincronia com movimentos de arte internacional como a Transvanguarda italiana, a Bad Painting norte-americana, o neoexpressionismo alemão, o Pós-Modernismo – e que culminou na emblemática exposição “Como vai você, Geração 80?”, em 1984, também no Parque Lage.

Mas o trabalho de Suzana que me causou impacto mais forte foi certamente o “Velofluxo”, de 2008, um enorme balão multicor se elevando aos céus pela leveza do ar aquecido, conduzindo espectadores a sobrevoar paisagens de algumas cidades brasileiras. Minha experiência com o “Velofluxo” foi em Brasília, onde eu morava na época. A praça do Centro Cultural Banco do Brasil, CCBB, no SCS (os endereços de Brasília são assim, siglas enigmáticas) foi a plataforma de lançamento usada pela artista para seu projeto, concebido e construído como uma pintura que tivesse se libertado das duas dimensões de um suporte para enfrentar o espaço; e se materializava na forma de um simples e poético balão colorido, com espaço para piloto e passageiros/espectadores e que, preso por um fino fio, flutuava e dançava ao sutil comando do vento. Aquela esfera em cores fortes, pairando contra o azul do céu e a arquitetura icônica da cidade modernista, transformava todo o espaço do Planalto Central do Brasil em um palco de contemplação artística, em arte viva.

Também tive a oportunidade, na mesma Escola de Artes Visuais, de ter Suzana Queiroga como professora, que a todos conquistava com sua seriedade, exigência, conhecimento multidisciplinar e carisma. Suzana veio morar em Portugal em 2017 e seu trabalho continua a se expandir, mantendo presença em eventos no Brasil, em Portugal e em outros países europeus, com prêmios e trabalhos em importantes coleções particulares e instituições.

A mostra “Some Questions” nos apresenta novas questões desta artista inquieta e incansável, cujas obras vão muito além de um balão nos céus, das pinturas e desenhos, das esculturas coloridas e infláveis ocupando parques e florestas, das instalações e das performances. Um corpo de obra que a artista constrói na labuta diária no ateliê e nas coreografias silenciosas que são criadas pelos objetos com o ambiente e com os espectadores, nos ensinando, de forma suave e profunda, a ver a poesia do invisível e a perceber os fluxos sutis que nos conectam com o céu e com o futuro.

Serviço:

FEMA Gallery apresenta “Some Questions”, exposição individual da artista Suzana Queiroga

Abertura: 8 de novembro, sábado, das 16 h às 19 h

Local: FEMA Gallery – Rua Afonso Sanches, 9 – Cascais

Visitação: até janeiro de 2026

Entrada gratuita