Num jantar-debate dedicado ao tema “As Independências em Língua Portuguesa”, Eugénio Monteiro Ferreira — historiador com uma vasta obra e vivência repartida entre Angola e Portugal — trouxe à mesa duas “pontes” que, na sua perspetiva, ajudam a compreender não apenas o passado, mas também o presente das ex-colónias lusófonas, com particular foco em Angola.

A primeira ponte remete para a tensão permanente entre dois grupos que atravessam a história recente africana: por um lado, aqueles que procuram eliminar todos os vestígios do colonialismo, regressando a modelos tradicionais; por outro, os que defendem a adoção de novos instrumentos e métodos vindos de outros contextos, integrando-os na construção nacional. Esta fratura, segundo o historiador, esteve presente desde as lutas armadas e permanece, de formas diferentes, até hoje.

A segunda ponte surge de um episódio pouco investigado: o encerramento, entre janeiro de 1974 e o 25 de Abril, das portas do consulado dos países nórdicos em Luanda — um movimento diplomático cujas razões permanecem pouco claras, mas que poderá ter tido impacto nos meses decisivos que antecederam a independência.

Ferreira contextualizou ainda a movimentação de grupos ligados à economia, à política e à cultura logo após janeiro de 1974, identificando um problema estrutural decorrente da tensão interna no MPLA entre as suas frentes interior e exterior. A análise incluiu referências outras figuras-chave e às ligações entre forças vivas locais, militares portugueses e setores democráticos e liberais da oposição.

O historiador questionou, meio século depois, se as mentalidades realmente mudaram, apontando para a persistência de lógicas de fracionismo político e militar, e para o papel das grandes potências na configuração das independências africanas. Ao revisitar este período, não apenas desafia narrativas cristalizadas, como abre pistas para investigações mais aprofundadas sobre as ligações entre Angola, o contexto internacional e os equilíbrios de poder que moldaram o seu caminho pós-independência.