Este documento, circula pelas unidades militares do país onde recebe apoios significativos, de oposição ao documento “Guia Povo / MFA”, redigido por um dos setores do bloco revolucionário com ligações ao PCP, o Diretório do MFA, constituído por Costa Gomes, Otelo Saraiva de Carvalho e Vasco Gonçalves, que se tinha formado na Assembleia do MFA, de 25 de julho de 1975, como resposta à contestação dos oficiais moderados em relação ao desenvolvimento do processo revolucionário, decide suspender os seus autores do CR e avançar para a formação do V Governo Provisório.
Uns dias depois, a 13 de agosto, o outro bloco do campo da revolução faz sair um outro documento, o “Documento do COPCON (Comando Operacional do Continente), redigido por Mário Tomé, que tem o apoio da UDP (União Democrática Popular), MES (Movimento da Esquerda Socialista) e PRP / BR (Partido Revolucionário do Proletariado / Brigadas Revolucionárias).
Se o setor mais revolucionário no seio do MFA ainda tem força para constituir o V Governo Provisório, o grupo dos nove, em ligação estreita com o PS, consegue desequilibrar a situação a seu favor.
A queda do V Governo segundo sob pressão estadunidense e soviética e a sua substituição pelo VI Governo Provisório, chefiado pela Almirante Pinheiro de Azevedo, que surge a 19 de setembro de 1975, significa o isolamento no interior do MFA do grupo dos militares ligados a Vasco Gonçalves e a vitória do grupo dos nove que, entretanto, são reintegrados no CR, reforçando a sua posição, a partir desta altura, nas diversas assembleias das forças armadas.
Ha um posicionamento democratico face ao contextk político-militar, com os trabalhadores divididos e os partidos à esquerda do PS a procurarem inverter a situação através de manifestações de rua de que são exemplos a manifestação de 16 de novembro, em Lisboa, onde estão presentes não só os operários da cintura industrial da capital, mas também os assalariados rurais do Alentejo, e o cerco à Assembleia Constituinte feito pelos operários da construção civil a 11 do mesmo mês.
O PS, por seu lado, em convergência com as forças à sua direita, mobiliza a sua base social de apoio em manifestações, também de rua, de apoio ao VI Governo Provisório de que são exemplos as manifestações de 9 a 23 de novembro, em Lisboa, respetivamente, no Terreiro do Paço e na Alameda.
Dominando o MFA e com fortes apoios na sociedade civil, especialmente no PS, o grupo dos nove espreita a primeira oportunidade para isolar os militares revolucionários no interior das forças armadas e pôr fim ao processo revolucionário, o que acontece a 25 de novembro de 1975.
Trabalharemos os Documentos que aqui deixamos e que marcam o fim do famoso PREC, Processo Revolucionário Em Curso !
Vejamos o Documento dos 9
Camarada:
O documento anexo, dirigido a S. Ex.ª o Senhor Presidente da República e entregue para conhecimento ao Senhor Comandante do COPCON, dado o seu carácter de urgência e a dificuldade de o discutir com os camaradas dispersos por todo o Pais para averiguar da sua eventual adesão ao seu conteúdo, foi assinado apenas por aqueles que o elaboraram.
Sugere-se assim que todos os militares que concordem com o seu conteúdo o subscrevam igualmente, remetendo, pessoal ou colectivamente, conhecimento desse facto a S. Ex.ª o Senhor Presidente da República.
Os camaradas que subscreveram o ORIGINAL, membros do CONSELHO DA REVOLUÇÃO, foram:
NOTAS:
Anexo
1. Os recentes desenvolvimentos da situação em Portugal, incluindo o que tem vindo a processar-se no interior das Forças Armadas, decidiram um grupo de oficiais a tomar uma posição crítica relativamente aos acontecimentos mais em foco no desenrolar dos diversos episódios que têm pautado a conturbada vida política dos portugueses nas últimas semanas.
Parece a esses oficiais que se chegou a um ponto crucial do processo revolucionário iniciado em 25 de Abril de 1974 e que é o momento das grandes opções, tomadas com serena e inquebrantável energia, em relação ao futuro deste país.
Parece-lhes, também, que é o momento de se clarificarem posições políticas e ideológicas, terminando com ambiguidades que foram semeadas e progressivamente alimentadas por todos aqueles que, dentro e fora das Forças Armadas, estavam interessados no descrédito de uns tantos para melhor poderem fazer valer e impor as suas próprias ideias.
Recusam, à partida, os oficiais que por esta forma se manifestam, o epíteto de «divisionistas» com que têm tentado denegri-los, tendo-se chegado ao escandaloso despudor de se sugerir a sua expulsão das F. A. Eles não abdicam do seu direito de crítica, direito esse que, num tão grave momento da vida nacional, assume o carácter de dever patriótico.
2. O Movimento das Forças Armadas nasceu do espírito e do coração de um punhado de oficiais democratas, patriotas e antifascistas que decidiram pôr termo a uma longa noite fascista e iniciar com todo o povo português uma nova caminhada de paz, progresso e democracia, na base de um Programa Político universalmente aceite e respeitado. Sabe-se como as grandes movimentações das massas populares abriram novas perspectivas à revolução democrática iniciada em 25 de Abril de 1974 e como, a partir sobretudo das eleições gerais para a Assembleia Nacional Constituinte, a via para o socialismo passou a ter carácter irreversível.
O «Programa do Movimento das Forças Armadas» era o elemento teórico da revolução democrática mas continha já o essencial das propostas políticas que apontavam para um dado modelo de socialismo. Em virtude disso, o pensamento de esquerda subjacente à elaboração do «Programa» não foi em nada ferido pelos chamados «avanços do processo revolucionário», onde e quando esses «avanços» corresponderam efectivamente à destruição das estruturas políticas, económicas e sociais do antigo regime e foram na prática, substituídas por novas estruturas operativas e actuantes, base de uma nova organização polítíco-social de raiz socialista.
Infelizmente, porém, quase nunca se verificaram transformações deste tipo.
Assistiu-se, sim, ao desmantelamento de meia dúzia de grandes grupos financeiros e monopolistas; mas, paralelamente, e à medida que as nacionalizações se sucediam (a um ritmo impossível de absorver, por muito dinâmico que fosse o processo e por maior que fosse o grau de adesão do povo, sem grave risco de ruptura do tecido social e cultural pré-existente — é o que se verifica actualmente), foi-se assistindo à desagregação muito rápida das formas de organização social e económica que serviam de suporte a largas camadas da pequena e média burguesia, sem que fossem criadas novas estruturas capazes de assegurarem a gestão das unidades produtivas e dos circuitos económicos e de manterem o mínimo indispensável de normalidade nas relações sociais entre todos os portugueses.
Entretanto, e paralelamente, verifica-se a progressiva decomposição das estruturas do Estado. Formas selvagens e anarquizantes de exercício do poder foram-se instalando um pouco por toda a parte (até no interior das F. A.) retirando proveito dessa desordem as organizações ou formações partidárias mais experientes e ávidas do controlo dos vários centros do poder. O M. F. A., que inicialmente se havia afirmado como suprapartidário, viu-se cada vez mais enleado nas manipulações politiqueiras de partidos e organizações de massas, acabando por se ver comprometido com determinado projecto político que não correspondia nem à sua vocação inicial nem ao papel que dele esperava a maioria da população do país: o de guia e condutor dum processo de transformação profunda da sociedade portuguesa, com um claro projecto político de transição para o socialismo, independente dos partidos, embora sem dispensa do seu concurso e com a mais ampla base social de apoio possível.
3. O país encontra-se profundamente abalado, defraudado relativamente às grandes esperanças que viu nascer com o M. F. A. Aproxima-se o momento mais agudo duma crise económica gravíssima, cujas consequências não deixarão de se fazer sentir ao nível duma ruptura, já iminente entre o M. F. A. e a maioria do povo português. Alarga-se, dia a dia, o fosso aberto entre um grupo social extremamente minoritário (parte do proletariado da zona de Lisboa e parte do proletariado alentejano), portador de um certo projecto revolucionário, e praticamente o resto do país, que reage violentamente às mudanças que uma certa «vanguarda revolucionária» pretende impor, sem atender à complexa realidade histórica, social e cultural do povo português.
Finalmente, a fase mais aguda da descolonização (Angola) chega, sem que se tenha tomado em consideração que não era possível «descolonizar», garantindo uma efectiva transição pacífica para uma verdadeira independência, sem uma sólida coesão interna do poder político, e sem, sobretudo, se ter deixado de considerar que a «descolonização» devia continuar a ser, até se completar, o principal objectivo nacional. Vemo-nos agora a braços com um problema em Angola que excederá provavelmente a nossa capacidade de resposta, gerando-se um conflito de proporções nacionais que poderá, a curto prazo, ter catastróficas e trágicas consequências para Portugal e para Angola. O futuro duma autêntica revolução em Portugal está, em todo o caso, comprometido, em função do curso dos acontecimentos em Angola, à qual nos ligam responsabilidades históricas inegáveis para além das responsabilidades sociais e humanas imediatas para com os portugueses que lá trabalham e vivem.
4. Todo este grave conjunto de aspectos da vida nacional têm vindo sistematicamente a ser escamoteados e, mais do que isso, profundamente adulterados, por larga parte dos meios de comunicação social, através de um rígido controlo partidário que sobre eles se exerce - particularmente dos nacionalizados - assistindo-se hoje ao degradante e vergonhoso espectáculo da corrida de uma boa parte da população aos noticiários de emissoras estrangeiras sobre o nosso país.
Como se isto não fosse já bastante, foi-se ao cúmulo de preparar um projecto de diploma que, ao instituir uma «comissão de análise» (e porque não «comissão de censura»?) servirá de ferro de lança apontado aos últimos e resistentes baluartes da Imprensa livre neste país.
5. Não se pretende esgotar, neste documento, a crítica à acção do regime instaurado após o 25 de Abril ou, em especial, das instituições após o 28 de Setembro de 1974. Recentemente, muitas contribuições críticas têm vindo a público que, no essencial, esclarecem sobre as debilidades fundamentais do actual regime.
Importa, ao grupo de oficiais que entendeu chegado o momento de tomar posição, definirem-se tão claramente quanto possível, perante o povo português e relativamente às várias instâncias de poder político e, em particular ao M. F. A. E assim, entendem deixar expresso, o seguinte:
— Recusam-se o modelo de sociedade socialista tipo europeu oriental a que fatalmente seremos conduzidos por uma direcção política que crê, obstinadamente, que uma «vanguarda» assente numa base social muito estreita fará a revolução em nome de todo o povo, e que tem, na prática, tolerado todas as infiltrações dessa «vanguarda» nos centros de poder político e nas estruturas militares.
O dirigismo burocrático típico de regimes totalitários é frontalmente negado por aqueles que lutaram no passado contra o fascismo e coerentemente se colocam agora numa perspectiva de luta contra novas formas de totalitarismo.
— Recusam-se o modelo de sociedade social-democrata em vigor em muitos países da Europa Ocidental, porque acreditam que os grandes problemas da sociedade portuguesa não podem ser superados pela reprodução no nosso país dos esquemas clássicos do capitalismo avançado.
Seria um erro trágico, no momento em que tudo leva a crer que se avizinha uma crise geral e global do capitalismo, que se tentasse, mesmo à custa de benefícios reais imediatos mas manifestamente ilusórios, a repetição das experiências sociais-democratas.
— Lutam por um projecto político de esquerda, onde a construção duma sociedade socialista — isto é, uma sociedade sem classes, onde tenha sido posto fim à exploração do homem pelo homem — se realize aos ritmos adequados à realidade social concreta portuguesa, por forma a que a transição se realize gradualmente, sem convulsões e pacificamente.
Este objecto só será atingido se, à teoria leninista da «vanguarda revolucionária», impondo os seus dogmas políticos de forma sectária e violenta, se opuser a estratégia alternativa da formação dum amplo e sólido bloco social de apoio a um projecto nacional de transição para o socialismo.
Este modelo de socialismo é inseparável da democracia política. Deve ser construído, pois, em pluralismo político, com os partidos capazes de aderir a este projecto nacional. Este modelo de socialismo é inseparável, ainda, das liberdades, direitos e garantias fundamentais. Não se nega que possam sofrer transformação do seu conteúdo à medida do avanço do processo histórico. No entanto, uma concepção revolucionária de socialismo, para um país europeu como Portugal, inserido no contexto geopolítico e estratégico em que se encontra, e com o passado histórico & cultural que é o seu, não desvincula o problema fulcral da liberdade humana do da construção do socialismo.
— Reclamam e lutam por uma autêntica independência nacional (tanto política como económica) o que significa aplicação coerente duma política externa adequada às nossas realidades históricas culturais e geopolíticas, o que implica:
— abertura de relações com todos os países do mundo, na base da igualdade, respeito mútuo e não ingerência nos assuntos internos de cada país, tendo em conta a necessidade de independência relativamente às grandes potências;
— manutenção das nossas ligações com a Europa, reforçando e aprofundando as relações com certos espaços económicos (C. E. E., E. F. T. A.);
— franca abertura em relação ao Terceiro Mundo (com particular relevo para as nossas antigas colónias) e países árabes;
— aprofundamento das relações com os países socialistas do leste europeu;
— desenvolvimento duma estratégia da área do Mediterrâneo, em conjugação com todos os países interessados, tanto europeus como árabes.
— Lutam por recuperar a imagem primitiva do M. F. A., no sentido em que o M. F. A. só teve aceitação universal enquanto aparelho autónomo de produção política e ideológica.
Assim se explica o consenso que se formou em torno do seu programa. Considera-se indispensável, pois, para a resolução correcta da crise gravíssima que o país atravessa, que o M. F. A. não só se afirme suprapartidário como desenvolva uma prática política realmente isenta de toda e qualquer influência dos partidos. Só assim reunirá condições para recuperar a sua credibilidade e cumprir a sua vocação histórica de árbitro respeitado e motor do processo revolucionário.
Só assim, também, poderá esperar que um grande bloco social de apoio, englobando proletariado urbano e rural, pequena burguesia e largos estratos da média burguesia (incluindo técnicos e Intelectuais progressistas) possa ainda formar-se, criando a base de sustentação indispensável à realização prática das grandes transformações por que deve passar a sociedade portuguesa.
— Recusam a instituição de uma política que assente em medidas e práticas demagógicas, qualquer que seja o seu carácter, que mais não são do que a prova da real incapacidade de equacionar os grandes problemas da sociedade portuguesa e de lhes encontrar soluções adequadas e justas, termos duma política de equilíbrio e verdade, única forma legítima de obter uma ampla mobilização das bases sociais de apoio.
— Entendem que a tão falada questão da «crise de autoridade» reflecte a questão mais geral do «poder político». Onde se situa o poder político? Quem é o seu real detentor? Como faz uso dele?
Julga-se que a questão do poder não é tanto o problema do poder ao nível das instâncias governativas como ao nível do M. F. A. Isto é: a questão do poder é a questão do poder no interior do M. F. A.
A clarificação deste problema é tarefa prioritária. Sem isso não é possível atacar a fundo o problema da organização do Estado, evitando a sua completa ruína. As divergências surgidas no seio do M. F. A. são reflexo de projectos ideológicos distintos. Projectos incompatíveis entre si, pois não é possível conciliar uma concepção totalitária de organização da sociedade com uma concepção democrática e progressista ou ainda com vagas concepções populistas de feição anarquizante.
É necessário denunciar vigorosamente o espírito fascista subjacente ao projecto que, dizendo-se socialista, acabará na prática duma ditadura burocrática dirigida contra a massa uniforme e inerte dos cidadãos dum país.
É necessário repelir energicamente o anarquismo e o populismo que conduzem inevitavelmente à catastrófica dissolução do Estado, numa fase de desenvolvimento da sociedade em que, sem Estado, nenhum projecto político é viável.
A resolução da crise do poder no interior do M. F. A. - e, portanto, da questão do poder ao nível do Estado - não terá porém, saída, enquanto tratada apenas ao nível dos diferendos ideológicos. E indispensável, na prática, encontrar solução adequada para o problema da dispersão dos «centros de poder». Sem o mínimo de «unidade de comando» a direcção política revelar-se-á cada vez mais fluída, vogando perdida no mar encapelado de decisões arbitrárias duma 5.ª Divisão do E. M. G. F. A., duma Assembleia do M. F. A., de Assembleias militares «ad hoc» reunidas imprevista e misteriosamente, de Gabinetes de Dinamização, do Conselho da Revolução, do COPCON, de Sindicatos, etc. Ao Governo, nestas condições, que espaço político de manobra lhe resta e com que autoridade actua? Nenhuns planos poderão ser coerentemente concebidos e aplicados sem um Governo que, por um lado, não deixe margem para dúvidas quanto à sua capacidade de execução do projecto político global definido pelo M. F. A. e que, por outro, seja revestido da autoridade necessária para se fazer obedecer.
6. Em cada dia, a cada hora que passa, multiplicam-se os sinais evidentes duma agitação social que tende perigosamente a alastrar, submergindo o país numa onda de violência incontrolável.
Acumulam-se factores que geram a promoção duma ampla base social de apoio ao regresso do fascismo. E é ridículo dizer-se, como certas formações políticas e certos órgãos de Informação que são, «manobras da reacção». O descontentamento, o mal-estar, a angústia, são reais e por demais evidentes e têm a sua causa profunda em erros de direcção política acumulados ao longo dos últimos meses e em desvios graves de orientação no interior do próprio M. F. A.
Que fazer?
Encontramo-nos em mais uma encruzilhada da história, e é ao M. F. A., uma vez mais, que compete assumir o peso maior das responsabilidades para com o povo português.
É imperioso escolher conscientemente a via para o socialismo, sem violar a vontade da grande maioria dos portugueses, conquistando hesitantes ou descontentes pela persuasão e o exemplo. Terá de competir ao M. F. A., em completa independência dos partidos políticos, mas tendo em conta o papel que estes podem e devem representar, definir um projecto político de transição para o socialismo.
É necessário reconquistar a confiança dos portugueses, acabando os apelos ao ódio e as incitações à violência e ao ressentimento. Trata-se de construir uma sociedade de tolerância e de paz e não uma sociedade sujeita a novos mecanismos de opressão e exploração, o que não poderá ser realizado com a actual equipa dirigente, ainda que parcialmente renovada, dada a sua falta de credibilidade e manifesta incapacidade governativa.
É preciso, finalmente, conduzir o país, com justiça e equidade, e segundo regras firmes e estáveis, em direcção ao socialismo, à democracia e à paz.
A 5.a Divisao e o COPCON
Sobre a autocrítica revolucionária do COPCON e a sua proposta de trabalho político, a 5.ª Divisão do Estado-Maior General das Forças Armadas não pode deixar de se pronunciar. Fizemos hoje de manhã um plenário de oficiais, sargentos e praças e outros militares da 5.ª Divisão e do consenso geral, concluindo-se pelo apoio, na generalidade, à proposta de trabalho do COPCON». Esse é o início da opinião oficial da 5.ª Divisão do E. M. G. F. A., lido pelo capitão Clemente, através do Programa do M.F.A., na Emissora Nacional, segundo um telegrama da A. N. I.
Segundo a opinião da 5.ª Divisão, «isso não quer dizer que não haja aspectos desta proposta de trabalho que mereçam da parte da 5.ª Divisão do E. M. G. F. A., seus oficiais, sargentos e praças, críticas construtivas. A primeira crítica de fundo é que julgamos, num aspecto construtivo, que essa proposta de trabalho vem aglutinar as forças progressistas no sentido de travar a reacção, a escalada reaccionária que neste momento se assiste no País através de processos mais ou menos demagógicos, através de promessas que não conseguem esconder a sua raiz de classe, a sua raiz de interesses burgueses. É por isso que nessa proposta de trabalho do COPCON merece especial relevância o número 1 da proposta em que se afirma que um programa revolucionário para a solução da situação tem que passar, antes de tudo, pela realização do projecto de aliança Forças Armadas-Povo, o qual garante a direcção dos trabalhadores na resolução dos seus problemas. Este é um aspecto muito importante. Sem essa participação o socialismo é impossível».
Depois de comentar esse ponto importante do documento, o capitão Clemente prosseguiu na opinião oficiosa da 5.ª Divisão: «Parece que o documento está incompleto em vários aspectos. Por exemplo, o aspecto 1-8 da autocrítica, onde é analisada a acção das Campanhas de Dinamização Cultural. Isto não é uma questão de defesa das campanhas porque ela está a cargo da 5.ª Divisão, além de que nós não pretendemos ser sectários a defender aquilo que fazemos. Pretendemos sim assumir aspectos de uma crítica correcta, revolucionária. Reconhecemos e fazemos muitas vezes a nossa Própria autocrítica ás Campanhas de Dinamização Cultural. Não Podemos é embarcar ou ir em aspectos que não correspondem verdadeiramente à realidade. Diz, a dado passo, este documento, que essas campanhas, apoiadas em verbalismos, despidos de significado para quem eram dirigidos, foram na maioria dos casos, prejudiciais. Isso pode ter acontecido e elas podem ter sido prejudiciais. Prejudiciais como? Se provocaram confusão, se agrediram as pessoas. Mas agrediram quem? Agrediram os explorados ou exploradores? Os caciques ou o povo trabalhador? Os padres reacionários ou povo trabalhador? A quem incomodam as Campanhas de Dinamização Cultural? É uma pergunta que tem fácil resposta. E diz mais o documento que não foram acompanhadas de quaisquer medidas concretas, capazes de demonstrar ao povo que o objectivo era a real melhoria das suas condições de vida».
Sobre esse problema, afirma a 5.ª Divisão:
«Todas as campanhas de dinamização cultural têm por base a palavra, o abrir os espíritos. Provavelmente agrediram algumas pessoas porque elas estão alienadas e foram-lhes feitas promessas de vida que não visavam a justiça social, mas visava o bem-estar, que é diferente, visava dar uma casa ou um carro a um, quando cá fora outros não tinham comida, não tinham assistência médica, não tinham alimentação ou educação. Portanto, objectivos sociais numa sociedade capitalista. Nesse caso, é natural que sejam agredidos. Os militares progressistas chegam e falam uma linguagem que não é familiar às pessoas. Mas, pretender que se leve a palavra e que se leve a construção daquilo que falta, é efectivamente pretender algo de impossível e de irrealizável. Nós militares, nós M.F.A., nós Campanha de Dinamização Cultural, quando vamos e falamos, não podemos ao mesmo tempo falar e construir. É por isso que nesse documento, no seu ponto n.º 3 se diz que se devem criar mecanismos que permitam o apoio efectivo e imediato aos pequenos e médios comerciantes, industriais, desenvolvendo ao mesmo tempo condições que fomentem o associativismo e o cooperativismo».
Segundo a opinião oficializada da 5.ª Divisão do E. M. G. F. A., «é com a associação e organização que as pessoas que defendem os mesmos interesses da classe operária, dos camponeses devem agir.
Os camponeses que viveram isolados são facilmente permeáveis em pressões demagógicas exploradoras. Mas de uma maneira geral, ainda há um aspecto que nos parece importante referir como crítica.
«Nós não temos medo de falar dos partidos políticos», afirma a 5.ª Divisão. «Estamos fartos de que nos chamem a 5.ª Divisão do E. M. G. F. A. dos comunistas. Nós não temos nada a ver com isso. Entendemos que efectivamente a luta passa por todos os braços, todas as pessoas de esquerda, seja de que partido for. Provavelmente temos entre nós militantes de todos os partidos e com certeza devemos ter militantes do Partido Comunista Português. Não podemos confundir o Partido Comunista Português, com o Partido Popular Democrático, com o Partido Socialista, com o C.D.S., com o P.D.C., com a F.S.P., pois cada um tem o seu programa, sua forma de actuação. Mas ainda aqui temos de distinguir os grupos de actuação: os que actuam para a esquerda e os que actuam para a direita. Os que actuam na defesa dos trabalhadores e os que actuam contra os trabalhadores. Numa primeira fase, aqueles que actuam em favor dos trabalhadores, poderão actuar mal. Ainda nos falta tanta coisa e neste momento não podemos dizer quem é que actua melhor, para já temos de saber quem são os amigos da classe trabalhadora e quem são os inimigos da classe trabalhadora. Não nos interessam as promessas ou as intenções, nos aspectos subjectivos. Interessa-nos muito mais o aspecto objectivo. Sabemos muito bem quais são os partidos de esquerda que estão com os trabalhadores e quais são os partidos de direita que não estão com os trabalhadores. É por isso que não podemos aceitar numa análise menos fácil e linear, simplista, e confundir, pois temos que criticar a actuação dos partidos de esquerda, actuação dentro de uma família de esquerda. Temos que fazer críticas severas a determinadas actuações. Sentimos que neste documento há determinada crítica à actuação do Partido Comunista Português, que nos parece correcta, mas, e as críticas ao Partido Socialista?»
«E as críticas ao Partido Popular Democrático? E e as críticas ao C. D. S. e ao P.D.C.? Onde estão? Há que fazê-las honestamente, com coragem, sem receios, se não confundimos mais, em vez de aclarar. E um dos propósitos deste documento também é aclarar.
Portanto, a 5.ª Divisão do E. M. G. F. A. está com a classe trabalhadora. Estando com a classe trabalhadora, está com esta proposta de trabalho enquanto defende, como parece, os interesses da classe trabalhadora, e como tal, apoia na generalidade este documento e reserva o seu direito revolucionário de o criticar, como está fazendo neste momento».
Antes de terminar, o capitão Clemente afirmou que «não podemos esquecer aquelas pessoas que não estão ainda esclarecidas, mas estão com a revolução portuguesa. Não podemos esquecer que estamos a dar tempo de recuperação ao capitalismo, estamos a dar tempo à reacção, estamos a permitir que o capitalismo internacional se organize, organize seus ataques. Precisamos ter cuidado com aqueles que a podem infiltrar em defesa desta proposta de trabalho, em defesa deste projecto. Temos que o mais rapidamente possível darmos os braços uns aos outros e recuperar o tempo perdido, andar depressa, com cerrada vigilância porque a reacção e o capitalismo internacional se infiltram, querem destruir, dividir o M.F.A. e as forças progressistas portuguesas.»
DOCUMENTO DO COPCON
I — A SITUAÇÃO ACTUAL
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1. A situação a que o País chegou, em consequência da incapacidade verificada a todos os níveis em resolver os problemas concretos que se têm deparado aos órgãos de poder, desencadeou uma degradação económica geral com o inevitável acentuar do desequilíbrio entre zonas urbanas e zonas rurais e a zona industrial de Lisboa e outras zonas industriais menos desenvolvidas. O acentuado dirigismo e tentativas de controlo do aparelho de Estado por parte dos partidos, com especial realce do P.C.P., levou alguns militares com responsabilidade no processo revolucionário a apresentar documento que se afirma destinado a clarificar a actual conjuntura. Na prática resultou maior confusão, dadas as evidentes ambiguidades contidas no citado documento.
2. Em face disto, torna-se indispensável clarificar, de facto a situação actual, pelo que, deste modo, manifestamos ao País a nossa posição perante o assunto, por considerarmos que compete ao M.F.A. reconhecer os erros até agora cometidos, denunciando, sem tibiezas, as suas causas.
3. A degradação da situação económica, e respectivas implicações sociais e políticas, para amplas massas populares deve-se sobretudo, à falta de definição de uma linha política objectiva e de um programa governamental consequente; não se achou um conjunto de medidas económicas capaz de substituir o vazio criado pela desagregação da estrutura capitalista existente, e mantiveram-se por outro lado, todas as dependências em relação ao imperialismo, com todas as consequências, tais como fecho de fábricas, fuga de divisas, desemprego, pressões políticas descaradas sobre a nossa soberania.
4. O operariado das cidades e dos campos, bem como largos sectores de empregados de serviços, apoiados nas suas organizações de classe e numa rica tradição de luta têm conseguido uma defesa mais eficaz da sua situação económica contra o aumento de custo de vida, ainda que seja o sector mais afectado pelo alastramento do desemprego.
5. Embora amplamente divulgada a criação de estruturas e políticas de apoio a pequenos e médios comerciantes e industriais, constatou-se a sua total ineficácia, verificando-se que pelo contrário, a sua situação foi consideravelmente agravada devido ao aumento de impostos e outros encargos.
6. Os pequenos e médios agricultores do Norte e Centro do País têm visto a sua situação agravar-se constantemente desde o 25 de Abril, face ao aumento do custo de vida, dos materiais e produtos indispensáveis à lavoura, acrescido da dificuldade no escoamento e comercialização dos seus produtos. Não se organizou o Comércio Interno, eliminando a especulação; dos intermediários, e criando uma rede de distribuição que facilitasse a circulação do produtor ao consumidor, com benefícios para ambos. São, sem dúvida, os pequenos e médios agricultores quem presentemente sofrem os efeitos da degradação económica.
7. No campo da Assistência, não se fizeram chegar à província os meios materiais e humanos capazes de responder minimamente às mais prementes necessidades das populações.
8. No entanto desenvolveram-se entre as populações rurais campanhas de esclarecimento e dinamização, que por ausência de uma preparação prévia adequada, não respeitaram, muitas vezes as características sócio-culturais do meio onde se desenvolveram cometendo, em alguns casos, autênticas violentações à consequência e hábitos das pessoas. Estas campanhas, apoiadas em verbalismos despidos de significado para quem eram dirigidas, foram, na maioria dos casos, prejudiciais, pois não foram acompanhadas de quaisquer medidas concretas capazes de demonstrar ao povo que o objectivo era a real melhoria das suas condições de vida.
9. Verifica-se a existência de um clima de desânimo e descrença das populações, desmotivando-as para a Revolução de que são as principais e directas interessadas. As causas deste facto são, fundamentalmente, as seguintes:
A constatação desta realidade e o crescente descontentamento consequente tem sido explorado pela reacção que, manobrando e instrumentalizando este justíssimo desagrado, conseguiu provocar uma escalada de violência contestatária, levando as populações a uma oposição aberta ao M.F.A., por o identificarem com a linha política responsável por esta situação.
10. A realização das eleições nas condições em que se efectuaram, veio contribuir para confundir o povo quanto aos instrumentos que podia utilizar para controlo do aparelho de Estado e do Poder, dado que:
Tem de se reconhecer um forte grau de responsabilidade ao M.F.A., por ter feito das eleições um ponto de honra, aspecto este bem explorado por forças interessadas neste tipo de eleições.;
11. A inoperância de quatro governos provisórios não é só fruto do dirigismo que o P.C.P. tentou impor infiltrando-se no aparelho de Estado e nos órgãos de comunicação social, pois o P.S., P.P.D. e M.D.P./C.D.E., que neles estiveram presentes, compartilham das responsabilidades que, hoje, procuram despudoradamente escamotear. Dos partidos à direita do P.S., incluindo as cúpulas deste, não se pode esperar mais de que a tentativa de travar e inverter a marcha do processo revolucionário, por forma a garantir os privilégios da alta burguesia e a exploração desenfreada dos trabalhadores.
12. A insistência do M.F.A. em procurar resolver as contradições através de soluções de compromisso, negociadas com partidos burgueses e a cobertura que vem dando a manobras partidárias, provocam o descrédito dos militares perante os trabalhadores.
II —ANÁLISE DO «DOCUMENTO DOS NOVE»
1. Mas a solução da presente situação, pela qual é altamente responsável o M.F.A., não será encontrada com paliativos de direita, como propõe o documento que leva a esta tomada de posição. Não será certamente a manutenção de coligações no governo que permitirá avançar na construção do socialismo. Não é rejeitando conjuntamente a SOCIAL-DEMOCRACIA, O CAPITALISMO DE ESTADO, A DEMOCRACIA POPULAR, e as conquistas das classes trabalhadoras que se permitirá a estas vir a assumir a condução do processo, ou tão só, consolidar as posições já alcançadas. A proposta apresentada conduzirá à RECUPERAÇÃO PELA DIREITA abrindo a esta campo de manobra para a destruição da revolução, mau grado as intenções democráticas e patrióticas, na mente dos subscritores do documento.
2. A perspectiva económica apresentada de reforço de laços com a C.E.E. e a E.F.T.A., reforçará a sujeição do país a uma vergonhosa dependência ECONÓMICA-FINANCEIRA e POLÍTICA, pois quem ainda tivesse ilusões quanto aos seus desígnios, perdeu-as completamente com as últimas exigências apresentadas para a concretização da «AJUDA FINANCEIRA A PORTUGAL». Revitalizar a iniciativa privada através do investimento maciço de capital financeiro estrangeiro, traduz-se na pura e simples da INDEPENDÊNCIA NACIONAL. Não basta para mascarar tal desastre, dizer que também se deve comerciar com o Terceiro Mundo e os países de leste. Nem é abrindo as portas ao Imperialismo que se conseguirá levar a cabo uma descolonização correcta dos territórios ainda sob administração portuguesa e também vítimas de Exploração Imperialista.
3. Não é assumindo uma posição supra-partidária, sem demarcação em relação aos partidos de direita, que se recuperará a credibilidade pois afirma-se pretender construir o socialismo e não alcançar uma democracia burguesa mas ainda capitalista, o que obviamente acontecerá. Como pode um projecto denominar-se de esquerda quando escamoteia o papel das massas e recusa a acção das suas vanguardas?
Como se pode «criticar» o ritmo das nacionalizações?
Será mantendo nas mãos da burguesia a posse dos meios de produção que estes serão postos ao serviço do povo?
Como se pode ignorar o caciquismo e o papel da luta de classes na sua destruição?
Como se pode apelar para a concórdia sem distinguir exploradores de explorados?
4. Concretizando esta fase da análise crítica do documento refere-se o ponto fundamental, que não foi esquecido pelos seus subscritores. Trata-se do ponto fulcral da situação política actual e se refere ao crescendo da actuação do fascismo. Elementos concretos demonstram que o fascismo abandonou as cautelas defensivas para se lançar deliberada e claramente na ofensiva, através de actuações violentas aparecendo descaradamente à luz do dia. Historicamente está demonstrado que personalidades moderadas que pretendem despoletar acções violentas do fascismo por meio de posições conciliatórias, são as suas primeiras vítimas, ou, noutros casos, se transformam nos opressores das massas que pretendem libertar.
III — PROPOSTAS
1. Um programa revolucionário para solução da situação tem de passar, antes de tudo, pela realização do projecto de aliança M.F.A.—POVO, o qual garante a direcção dos trabalhadores na resolução dos seus problemas. Sem esta participação o socialismo é impossível. Há pois que pôr de pé uma estrutura de organização de massas populares, pela constituição e reconhecimento de conselhos de aldeias, de fábricas e de bairros, que sejam os órgãos através dos quais os trabalhadores possam tomar decisões no sentido de resolver os seus próprios problemas. Estes organismos de poder dos trabalhadores terão que ser um instrumento para as soluções económicas, para o planeamento social (escolas, hospitais, habitação, transportes), terão que ser, enfim, os verdadeiros órgãos do poder político, única barreira capaz de se opor vitoriosamente à agressão fascista e imperialista.
2. As soluções económicas para este país, têm de passar por uma alteração da estrutura, fazendo uma reconversão da economia no sentido de um total apoio efectivo à agricultura de modo a que rapidamente venha a produzir uma muito maior quantidade de bens alimentares, cuja compra no estrangeiro neste momento, é um dos factores do nosso défice na balança de pagamentos. Para tal é necessário planificar a agricultura, fazendo! uma revolução agrária, de acordo com a vontade expressa pelas Assembleias de Aldeia e outros órgãos de vontade dos pequenos e médios agricultores e, no sul, geridas pelos trabalhadores rurais, democraticamente eleitos, tendo umas e outras apoio financeiro e técnico que garanta a sua rentabilidade e condições de vida para os camponeses, que os aproximem cada vez mais dos operários da cidade.
3. Devem criar-se mecanismos que permitam o apoio efectivo e imediato aos pequenos e médios comerciantes e industriais, desenvolvendo ao mesmo tempo condições que fomentem o associativismo e cooperativismo.
4. Por outro lado Portugal tem de acabar com a dependência em relação ao imperialismo. Tem, pois, de deixar de depender financeira e tecnologicamente em relação aos países imperialistas, mesmo que para isso se tenha de suspender ou reconverter indústrias que foram implantadas no nosso País para explorarem a mão-de-obra barata dos trabalhadores portugueses.
Neste sentido há que cessar também com a sujeição à C.E.E. e E.F.T.A., que têm praticado uma política de chantagem em relação a Portugal. Enveredando por uma política económica de verdadeira independência nacional, o nosso País poderá então:
Nestas condições o nosso País ficará em posição de poder vencer o bloqueio do imperialismo, pelas contradições internas deste, uma das quais é a opinião pública dos respectivos países e, principalmente, a solidariedade das respectivas classes trabalhadoras e para os Povos do Terceiro Mundo, para quem o nosso processo revolucionário constitui enorme esperança e factor de unidade e luta.
5. O problema de centenas de milhares de desempregados deverá ser resolvido pela planificação económica, no sentido do pleno emprego. Para tal há que criar postos de trabalho nas agriculturas e na construção civil. Temos consciência que a reconversão da economia posta nestes termos, o início duma planificação socialista, a independência em relação ao imperialismo e a política de pleno emprego, trarão grandes dificuldades e grandes sacrifícios, mas estes têm de ser partilhados por toda a gente. Não se pode pedir que sejam só os trabalhadores a suportá-los. Neste sentido há que baixar muito o ordenado máximo nacional, o que vai tirar privilégios a estas camadas minoritárias da população.
6. Em relação à habitação há que definir uma política justa, que atacando frontalmente os grandes proprietários que fizeram da especulação o seu modo de vida, defenda os pequenos proprietários que através de rendimentos aceitáveis conseguem garantir a sua subsistência e dos seus familiares. Relativamente a este problema há que estabelecer um limite para rendas, entrando em linha a conta com a localização, tipo de construção, número de assoalhadas, etc. As comissões de moradores terão um papel decisivo no estabelecimento do critério adoptável.
7. Quanto ao problema da SAÚDE há que socializar a medicina, garantindo a prestação de serviços médicos na província, incluindo os meios técnicos e humanos das Forças Armadas. Como medida complementar terá igualmente de se proceder à nacionalização da indústria das especialidades farmacêuticas, regulando o seu fabrico de modo a condicionar o elevadíssimo número de medicamentos que apenas se diferenciam pela marca eliminando deste modo as grandes despesas publicitárias actualmente existentes que oneram extraordinariamente os seus custos.
8. Em relação ao ENSINO têm que ser garantidas condições para que haja realmente ensino básico para toda a gente, sendo o ensino secundário e superior subordinados desde já aos interesses das classes trabalhadoras.
9. Para além deste programa genérico, aplicável a médio prazo, que deverá ser discutido, corrigido e pormenorizado, com a colaboração de todos os órgãos de vontade popular e militar, entende-se que devem ser tomadas entre outras MEDIDAS URGENTES as seguintes:
10. Os meios de comunicação social deverão servir este programa, fomentando o debate franco, livre e total sem reservas de condicionalismos, destruindo, de uma vez por todas, qualquer forma de manipulação, dentro do princípio fundamental de que só desta forma se servem os interesses das classes trabalhadoras, e de que as contradições existentes só no seio do povo poderão ser resolvidas.
11. Para garantir a execução deste programa é necessária a definição do poder executivo que se responsabilizará por ele; que terá de ser um poder de transição. Este poder de transição será constituído pelo MFA e por todas as organizações políticas verdadeiramente revolucionárias, que reclamam e defendem o poder para os trabalhadores. Como tal terá de ser garantida como primeira medida e como fulcro do poder a constituir, a realização, de facto, da aliança MFA--POVO. Este poder será a direcção política deste período transitório até à realização da Assembleia Nacional Popular.
IV — ORGANIZAÇÃO INTERNA DAS FORCAS ARMADAS
1. A elaboração de uma proposta como esta que se pretende revolucionária, essencialmente apoiada na aliança MFA-POVO abordando apenas o sector popular, não tratando, ainda que superficialmente o aspecto interno das Forças Armadas constituiria um erro grave, cujas evidentes contradições poderiam assumir aspecto contra-revolucionários.
2. Assim, e de forma muito sucinta, considera-se indispensável que a estrutura interna das Forças Armadas necessita de se repensada a curto prazo visando, sobretudo, os aspectos seguintes:
a) Forma organizativa de classe
b) Regalias sociais
c) Reforço de disciplina
CONCLUSÃO
O presente projecto constitui a única proposta viável e realista que se oferece ao povo português para a sociedade socialista que se pretende alcançar, e constitui uma recusa firme e total ao FASCISMO, à SOC1AL-DEMOCRACIA e ao CAPITALISMO DE ESTADO, formas de exploração que negam a real emancipação das classes trabalhadoras.
VIVA A ALIANÇA ENTRE OPERÁRIOS E CAMPONESES!
VIVA A ALIANÇA INDESTRUTÍVEL ENTRE OS TRABALHADORES E AS FORÇAS ARMADAS REVOLUCIONÁRIAS!
VIVA A ALIANÇA MFA-POVO!
VIVA A REVOLUÇÃO SOCIALISTA!
VIVA PORTUGAL!
Documento Guia do Projecto Aliança Povo-MFA
Organização e introdução de Orlando Neves
Poder Popular - Documento Guia do Projecto Aliança Povo-MFA
(Assembleia do MFA (8/6/1975))
1. INTRODUÇÃO
A aliança Povo-MFA tem sido uma realidade constante do processo revolucionário até ao momento presente. A acção libertadora do 25 de Abril, continuada por todo um conjunto de atitudes do MFA e dos partidos políticos progressistas e pelai medidas de carácter político e económico postas em prática, tem permitido manter um nível suficiente de coesão Povo-MFA No entanto, a manutenção e consolidação da aliança Povo-MFA passa, numa primeira análise, pela satisfação das aspirações mal profundas das classes exploradas. Neste aspecto, urge prosseguir a obra iniciada em 25 de Abril de 1974. É dentro do âmbito de uma Revolução Cultural, pela aplicação das potencialidades militares e civis, nos campos técnico, humano e material que ri mobilizará decisivamente o Povo para a Revolução. A prática começa a demonstrar este raciocínio, aliás óbvio. Esta premissa «sine qua non» de consolidação da aliança está em desenvolvimento e criará as condições para que o binómio motor do pro cesso revolucionário português se mantenha e consolide.
Por outro lado, e ainda numa intenção de mobilizar o Povo para a Revolução, é necessário que às massas trabalhadoras sejam asseguradas condições de participação activa, o que passa por formas de organização popular, numa prática democrática, independente e unitária.
Torna-se necessário aproveitar, concretamente, esta realidade fundamental, aliança Povo-MFA, estimulando-a e apoiando-a pari a defesa e dinamização da Revolução em curso.
A Defesa e Dinamização da Revolução, na sua actual fase passam pela realização das seguintes tarefas:
Enquanto a produção não for suficiente para as necessidades globais do País, será necessário um grande esforço das massas trabalhadoras. É fundamental, portanto, vencer-se a batalha da economia, superando o fraco desenvolvimento das forças produtivas, ampliando e desenvolvendo o controlo operário, alargando-se o campo do sector estatal e procurando-se a acumulação necessária à nossa independência económica.
Para assegurar o cumprimento dos pontos anteriormente indicados, terá de se cuidar:
1. No campo interno:
2. No campo externo:
Em face do que fica exposto sugere-se a seguinte estruture de aliança Povo-MFA:
2.1 Explicação orgânica
2.1.1 — A estrutura da Aliança Povo-MFA terá três linhas fundamentais: a do MFA, a Popular e a Governamental.
Dentro desta fase de transição, o aparelho de Estado deverá ser saneado e progressivamente substituído, descentralizando os seus poderes (administrativo e financeiro), permitindo a iniciativa local sob o controlo, fiscalização e progressiva tomada do poder pelos organismos populares.
2.1.2 — As Comissões de Moradores, Comissões de Trabalhadores e outras organizações de base popular formarão Assembleias Populares Locais, de Freguesia ou por área a definir.
2.1.3 — Destas Assembleias Locais se formam as Assembleias Municipais e assim sucessivamente até à Assembleia Popular Nacional.
2.1.4 — A participação física do MFA começa nas Assembleias Municipais e Distritais pelas ADU's, nas Regionais, pelas ADR's e na Nacional pela AMFA.Entenda-se que as ADU's são assembleias de unidades do Exército, Marinha e Força Aérea e Forças de Segurança.
2.1.5 — O Conselho da Revolução é o órgão máximo da soberania nacional.
2.1.6 — As Assembleias Populares são apoiadas pelo MFA e órgãos do aparelho de Estado, exercendo sobre estes controlo da gestão pública na qual participam.
2.2 Lançamento das organizações populares
2.2.1 — Numa primeira fase as ADU's incentivarão através de sessões de esclarecimento e informação, o lançamento das Comissões de Moradores e Trabalhadores nos locais onde ainda não existam.
Nos locais onde já existem estruturas desta natureza haverá igualmente sessões de esclarecimento e informação sobre os verdadeiros objectivos do MFA.
Posteriormente, em contacto com estas organizações de base, colher-se-á a experiência da sua prática, recolhendo ensinamentos que serão divulgados no sentido de melhorar os procedimentos e alcançar resultados.
Após a apreciação pelo MFA proceder-se-á ao reconhecimento das organizações.
2.2.2 — Numa segunda fase, a curto prazo, incentivar-se-á a formação das Assembleias Populares Locais e Municipais.
2.2.3 — Numa terceira fase, a médio prazo, incentivar-se-á a formação das Assembleias Populares Distritais.
2.2.4 — Numa quarta fase, a longo prazo, incentivar-se-á a formação das Assembleias Populares Regionais.
2.2.5 — A Assembleia Popular Nacional, órgão superior de participação popular, será a última e distante etapa desta estrutura.
3. NORMAS ESTATUTÁRIAS
3.1 Generalidades
A organização popular proposta assenta, fundamentalmente, nascomissões de trabalhadores e nascomissões de moradores. Consideram-se também organismos de base os conselhos de aldeia, as cooperativas, as ligas de pequenos e médios agricultores, ascolectividades e outras associações de base popular.
Estruturas em vias de lançamento sob iniciativas várias devem ligar-se aos organismos de base definidos, CM e CT, os quais ampliarão a sua constituição, a fim de absorver e disciplinar atenções de consolidação e garante do processo revolucionário, no que se refere às tarefas das organizações de base referidas em 3.2.2.
Em conclusão, as CM e CT e outras organizações da base chamarão a si as tarefas de Defesa da Revolução.
As presentes normas estatutárias respeitam às já existentes nas diversas organizações, devendo estas ser ampliadas, a fim de incluir os objectivos aqui definidos.
3.2 Princípios orientadores da organização popular
3.2.1 Objectivo
O objectivo fundamental e último é o da construção da sociedade socialista definida no Plano de acção Política do Conselho da Revolução.
Como este objectivo só se consegue em unidade, todos os níveis da organização popular devem, pois, ser unitários.
Este conceito de UNIDADE define-se da forma seguinte:
A melhor garantia para se obter este objectivo é ser o MFA, movimento suprapartidário, a acompanhar e incentivar este processo, apoiando-o, integrando-o e reconhecendo as organizações que, pela prática, o justificarem.
3.2.2 Tarefas das organizações de base
As Comissões de Trabalhadores, Comissões de Moradores, etc., deverão, além das suas funções específicas, promover, de acordo com as suas características, as seguintes actividades:
Esta actividade, em casos especiais (pontos estratégicos da economia nacional), por iniciativa do próprio MFA e sob o seu controlo e enquadramento, pode traduzir-se em tarefas de autodefesa.
3.2.3 Tarefas das Assembleias Populares
As Assembleias Populares terão as seguintes missões fundamentais:
3.3 Processo de formação
3.3.1 — A direcção das organizações populares é eleita em plenário por votação de braço no ar.
3.3.2 — Nas organizações de base os membros eleitos são revogáveis pelo mesmo plenário que os elegeu.
3.3.3 — Nas Assembleias Populares os membros eleitos são revogáveis pelas próprias assembleias.
3.4 Constituição
3.4.1 — DAS ORGANIZAÇÕES DE BASE (CM, CT, etc.): terão a sua actual constituição, ampliada, por forma a satisfazer as tarefas definidas.
3.4.2 — DAS ASSEMBLEIAS POPULARES LOCAIS: delegados das organizações de base; delegados das autarquias locais.
3.4.3 — DAS ASSEMBLEIAS POPULARES MUNICIPAIS: delegados das ADU's; delegados das APL's; delegados das autarquias e órgãos governamentais.
3.4.4 — DAS ASSEMBLEIAS POPULARES DISTRITAIS: delegados das ADU’s; delegados das APUs; delegados das APM's; delegados das autarquias e órgãos governamentais; delegados dos organismos sindicais.
3.4.5 — DAS ASSEMBLEIAS POPULARES REGIONAIS: delegados da ADR (incluem comandante da RM); delegados das APD's; delegados das autarquias e órgãos governamentais; delegados dos organismos sindicais.
3.4.6 — DA ASSEMBLEIA POPULAR NACIONAL: a definir.
3.5 Funcionamento
3.5.1 — As decisões em todas estas organizações são tomadas por votação de braço no ar.
3.5.2 — Os representantes das autarquias locais, órgãos governamentais (gabinetes regionais de planeamento, Ira, etc.) e delegados dos organismos sindicais têm igual direito à apresentação de propostas, votação e expressão.
3.5.3 — As decisões tomadas em assembleias vinculam toda as estruturas ao seu cumprimento.
4. Disposições finais
4.1 — As presentes normas não têm carácter rígido e a sua aplicação atenderá às características específicas locais e aos condicionalismos determinados pela dinâmica do processo.
4.2 — O presente projecto deve ser considerado como um documento-guia da acção prática das unidades militares e organismos populares. A estrutura que corresponde ao actual desenvolvimento da organização popular vai até às Assembleias Populares locais.
Esta fase necessita ser devidamente consolidada, sendo através da própria dinâmica do processo em que se verificará a viabilidade do avanço para formas de organização superior.