Desde o início do conflito, a Turquia tem mantido uma posição de equilíbrio delicado entre a Ucrânia e a Rússia. Ancara forneceu drones Bayraktar à Ucrânia, ajudando nas suas operações militares, mas também preservou laços comerciais e diplomáticos estreitos com Moscovo. No entanto, a mais recente decisão de Erdogan pode representar uma mudança significativa: a Turquia está disposta a enviar tropas para atuar como força de paz em território ucraniano.
A proposta surge na sequência de negociações em Istambul entre delegações dos Estados Unidos e da Rússia, onde se discutiram possíveis cenários para um acordo de paz. Este anúncio coloca a Turquia numa posição estratégica inédita e, ao mesmo tempo, cria tensão com o Kremlin, que já demonstrou reservas em relação à presença de tropas estrangeiras na Ucrânia.
Em paralelo à iniciativa turca, o Reino Unido e a França tomaram a dianteira na formulação de um plano de cessar-fogo, que inclui um contingente europeu de 25.000 a 30.000 soldados para monitorizar e garantir a implementação do acordo. O primeiro-ministro britânico, Sir Keir Starmer, e o presidente francês, Emmanuel Macron, estão a trabalhar numa estratégia de quatro passos que visa garantir a soberania da Ucrânia, reforçar a sua segurança e, ao mesmo tempo, manter a pressão económica sobre a Rússia.
Starmer declarou que o Reino Unido está disposto a enviar tropas para garantir o cumprimento do acordo de paz, uma posição que já gerou reações tanto dentro como fora da NATO. O apoio de Washington a este plano parece limitado, com a administração Biden a demonstrar reservas sobre o envio de tropas norte-americanas, preferindo deixar essa tarefa a aliados europeus e não-europeus, como a Turquia.
A inclusão da Turquia na equação da paz levanta várias questões. Erdogan, que tem sido um hábil negociador entre Kiev e Moscovo, pode desempenhar um papel crucial na criação de um corredor diplomático que permita avançar para um cessar-fogo. No entanto, a presença de tropas turcas na Ucrânia pode ser vista por Vladimir Putin como uma provocação direta, especialmente se a Turquia insistir na retirada russa de territórios anexados, incluindo a Crimeia.
Além disso, há dúvidas sobre a reação de Kiev a uma possível missão de paz liderada pela Turquia. Se, por um lado, o presidente ucraniano Volodymyr Zelensky procura garantias internacionais para a segurança do seu país, por outro, há o receio de que qualquer acordo com a Rússia possa significar a perda definitiva de territórios ocupados.
Os recentes desenvolvimentos também ocorrem num momento em que a Rússia enfrenta desafios crescentes no campo de batalha e na sua economia. A moeda russa, o rublo, perdeu mais de metade do seu valor desde 2024, e as sanções internacionais estão a estrangular o setor energético do país. A capacidade industrial russa está reduzida, e a escassez de mão de obra, devido às baixas no campo de batalha, limita ainda mais a capacidade de Moscovo de prolongar a guerra indefinidamente.
Putin, que anteriormente se recusava a reconhecer Zelensky como interlocutor legítimo, agora parece disposto a considerar negociações diretas com a Ucrânia. Para muitos analistas, isso pode ser um sinal de que o Kremlin está a procurar uma saída estratégica da guerra antes que a situação se torne insustentável.
Ainda é cedo para afirmar que estamos perante o fim definitivo da guerra, mas os sinais indicam que a pressão internacional sobre a Rússia está a aumentar, e o espaço para uma solução diplomática está a ganhar força. A Turquia, ao posicionar-se como mediadora e potencial força de paz, pode ter um papel determinante no desenlace deste conflito.
No entanto, o envio de tropas turcas para a Ucrânia não será isento de riscos. Se Erdogan avançar com esta decisão sem o consentimento de Moscovo, poderá desencadear novas tensões entre a Rússia e a Turquia, países que já possuem um histórico de relações complexas. Além disso, resta saber até que ponto os países ocidentais, incluindo os Estados Unidos, aceitarão a Turquia como protagonista na pacificação da Ucrânia.
A questão que permanece é: será este um verdadeiro passo em direção à paz ou apenas mais uma jogada geopolítica num conflito que já dura há três anos? O desenrolar dos próximos meses será crucial para responder a essa pergunta.