CARLOS PRONZATO E SUA MARATONA CULTURAL

Paulo Martins, Editor Cultural

Poucos dias antes das comemorações dos 50 anos da Revolução dos Cravos, em 25 de Abril, desembarcou em Lisboa o cineasta, diretor teatral, escritor, poeta e agitador cultural Carlos Pronzato. De origem argentino/brasileira, Pronzato viveu muitos anos em Salvador, na Bahia, onde deixou vasto legado cultural e depois jogou âncora no Rio de Janeiro.

Cidadão do mundo e ativo participante dos movimentos sociais, Carlos está sempre presente onde a história, a política e a vida do povo o chama, circulando não só por muitos rincões do Brasil como nos de outros países. Dada a relevância da data, particularmente para o Brasil, concluiu pela necessidade de registrar, com sua câmara e sua visão pessoal, as marcas comemorativas da grande efeméride. Seu documentário se chamará FOI BONITA A FESTA, PÁ: MEMÓRIAS DO 25 DE ABRIL.
Em entrevista ao Brasil de Fato, o cineasta declarou: “ Hoje, 25 de abril, feriado aqui em Lisboa, uma gigante manifestação de celebração do fim de uma sanguinária ditadura de 48 anos. Emocionante. Gravamos inúmeras mini entrevistas com populares e pude ver de perto a famosa chaimite, o tanque utilizado na Revolução dos Cravos em 25 de abril de 1974, e também os capitães de Abril.” E arrematou: “No dia 25 de abril, em Portugal, me senti dentro do famoso quadro A poesia está na rua.” Não é à-toa que muitos dos protagonistas do MFA em 1974, ou eram poetas ou se tornaram poetas, como pôde constatar nas entrevistas que realizou. Além dos registros das comemorações, entrevistou vários ex-participantes ainda vivos daquele movimento, como os Capitães de Abril Vasco Lourenço, Duran Clemente, Rosado da Luz e Mário Tomé, além dos jornalistas Miguel Carvalho e Raquel Varela, do economista Francisco Louçã, da escritora feminista Ana Barradas, das pesquisadoras Irene Pimentel, Paula Godinho, Pamela Cabreira e outras personalidades.
Prosseguiu com seu trabalho não só em Lisboa, mas também em Porto e outras cidades onde o resgate histórico daqueles acontecimentos se tornou necessário, como em Santarém, de onde partiu a coluna de Salgueiro Maia e a Grândola, a famosa “vila morena” da canção de Zeca Afonso, que se transformou praticamente em hino do movimento libertário. Após uma breve viagem pela Suíça e a Itália, participando de eventos e divulgando suas obras, retomou a produção de seu projeto, enfrentando agora novos desafios.
Seu filme não está concluído. Embora trabalhe incansavelmente, seus recursos estão exauridos, e ele apela aos amigos e admiradores para que o ajudem a concluí-lo. Quem quiser e puder, pode enviar um PIX para a chave carlospronzato@gmail.com titular Tadeusz Manuel Carlos Pronzato (Brasil); no caso da Europa, pode fazer uma transferência para Carlos Jorge Pronzato, BIC TRWIBEB1XXX, IBAN BE82 9679 9534 6668, sua conta internacional na WISE, Rue du Trône, 100, 3dr floor, Bruessels 1050 Belgium. Os nomes dos colaboradores figurarão nos créditos da obra.
Mas não se pode dizer que Pronzato veio aqui apenas para a realização deste documentário. Por onde passou deixou a marca de sua extensa obra. Ao tempo em que exibia filmes de sua autoria em diversos espaços, divulgava seus artigos publicados quinzenalmente no jornal A TARDE, de Salvador, vários deles vinculados à nova experiência em Portugal, como o de 16.04.24, intitulado TANQUES DE ABRIL, PORTUGAL E BRASIL, mostrando os caminhos inversos dos dois exércitos. Encontrei-o, pela primeira vez, na Fundação José Saramago, que acolhia, num evento solidário, a advogada Marinete Franco, mãe da vereadora Marielle Franco, assassinada brutalmente no Rio de Janeiro em 2017, quando ele recitou um poema. Depois disso, acompanhei sua rica trajetória, na qual, além de exibir seus filmes anteriores, fez lançamentos de seus livros.
Em 03/05, no evento Uma Noite com Carlos Pronzato: Arte, Compromisso e Memória, uma espécie de Jornada Cultural organizada pela Casa do Brasil de Lisboa, o poeta apresentou e autografou seu livro POEMAS PARA RESISTIR – O CASO BRASKEM, da Editora CBA, Brasil. (poemas centrados no “Caso Braskem”, tragédia que afundou bairros inteiros de Maceió, no Estado de Alagoas, e comoveu o mundo), e exibiu seu filme A BRASKEM PASSOU POR AQUI, A CATÁSTROFE DE MACEIÓ, um documentário de 1h20m de duração.
O site CAPITAL BRASÍLIA assim resumiu a essência das duas obras, filme e livro:
“O filme não apenas apresenta o desespero e a indignação daqueles que perderam suas casas e meios de subsistência, mas também dá voz a especialistas, empresários e líderes comunitários que testemunharam a tragédia de perto. A produção independente contou com o apoio fundamental de movimentos sociais, sindicatos e pesquisadores locais, demonstrando o poder de união em busca de justiça e de reparação.”
“O livro reúne 20 poemas, escritos durante a gravação do documentário. Cada poema é um ato de resistência, uma expressão de solidariedade e empatia para com aqueles que foram afetados pela tragédia. Por meio da poesia, Pronzato mergulha nas profundezas da alma humana e dá voz aos sentimentos de perda, luta e esperança que permeiam a experiência daqueles que enfrentam adversidades tão devastadoras.”
No dia 05/05, na Casa dos Comuns, foi exibido seu filme COLÔNIA CECÍLIA, UM SONHO ANARQUISTA, numa parceria com Diogo Duarte, que lançou seu livro O ANARQUISMO E A ARTE DE GOVERNAR, da Edições Fora de Jogo, Portugal, com debate entre os dois autores.
No dia 10 de maio, Pronzato exibiu seu filme “RENATO, um de nós” na sede do Bloco de Esquerda, partido político português, numa promoção do Coletivo Andorinha. O filme é baseado na história do vereador Renato Freitas, negro, de Curitiba, que sofreu processo de cassação por falta de decoro parlamentar, simplesmente por ter participado de uma manifestação antirracista. Hoje, depois de heroica luta, Renato se tornou Deputado Estadual do Paraná, pelo PT.
No dia 11 de maio o cineasta exibiu seu filme ZUMBI DOS PALMARES, UMA VOZ PARA O MUNDO, no Terreiro do Amor, em Sintra, pelo que assim se expressou: “Se algo faltava a este velho cineasta documentarista cansado de guerras, era expor seu trabalho sobre Zumbi num Terreiro.” O insólito é que, aquilo que deveria ter acontecido naturalmente na Bahia, num dos numerosos espaços de resistência cultural lá existentes, acabou acontecendo do outro lado do Atlântico, em Sintra, cidade onde viveu Glauber Rocha, defronte da África.
Pronzato exibiu ainda UM SONHO ANARQUISTA no Ateneo Libertario de Milano no dia 7 de junho passado.
Este é o Carlos Pronzato, um cineasta inquieto, combativo, realizador incansável, preocupado com a vida do povo brasileiro, sempre pronto para o bom combate, seja com palavras, seja com imagens explosivas; um poeta que não esconde sua gênese, sua índole participativa, sua sensibilidade para com a existência sofrida do seu povo e sua luta pela sobrevivência e pela liberdade. Abaixo, um poema de seu livro citado:

Resistência 1:

O que afunda
não é uma casa
paredes
azulejos
janelas tampadas com cimento
portas fechadas n
pela última vez

O que afunda
não é uma escola
um hospital
o campo de treinos do CSA
tijolos infinitos
como lágrimas de sal

O que afunda
é a luz
do quarto das crianças
as flores que ficaram
os gatos perdidos
no silêncio do bairro

O que afunda
somos nós
um tremor de angústia
no fio da navalha
nossas vidas
nas cavernas
subterrâneas

Uma larga rachadura
no subsolo da alma.

 

Paulo Martins

Editor Cultural