O jornalista e publicitário Celso Japiassu acaba de publicar na Revista Forum, onde é colaborador, um artigo seminal sobre a situação da Europa, que se encontraria em pé de guerra diante da nova realidade surgida com o início da guerra na Ucrânia e a neurótica mobilização da OTAN contra a Rússia e seus possíveis aliados.

Prova que e situação é extremamente séria, ao alinhar uma série de medidas que estão sendo tomadas em diversos países da linha de frente da União Europeia, sinalizando uma preparação civil para enfrentar as consequências de uma guerra a curto prazo. Leia:

O fantasma de uma nova guerra lança sua sombra sobre a Europa. As gerações mais velhas trazem à memória a tragédia das duas guerras mundiais que, por duas vezes, destruíram o território do velho continente e abalaram sua civilização. As autoridades dos diversos países têm emitido alertas sobre a necessidade de se preparar para um conflito que, a cada dia, torna-se mais possível. Países como a Espanha e a Alemanha acusam um aumento na procura de bunkers de abrigo pela população. Os países nórdicos estão fornecendo instruções sobre como agir em caso de ataques.

Quatro países publicaram cartilhas de orientação para a população em situações de crise, incluindo cenários de ataques cibernéticos e conflitos armados. A Suécia distribuiu o panfleto “Se houver crise ou guerra” para 5,2 milhões de lares, com instruções sobre como agir em caso de guerra, desastres naturais ou ciberataques; a Finlândia publicou online novas orientações sobre “preparação para incidentes e crises”, incluindo informações sobre autodefesa em situações de conflito armado; a Noruega distribuiu mais de 2 milhões de cópias de um guia de preparação, orientando a população sobre como lidar com períodos sem eletricidade e o que fazer em caso de acidentes nucleares; a Dinamarca enviou orientações digitais para todos os adultos, detalhando como armazenar suprimentos básicos para emergências de curto prazo.

Na Alemanha, as autoridades estão elaborando um levantamento de bunkers que podem servir de abrigo de emergência para civis. O Ministério do Interior anunciou um aplicativo com uma lista de estações subterrâneas de metrô e trens, estacionamentos e prédios públicos e privados que podem servir como abrigos. O governo também começou a incentivar a população a criar abrigos na própria casa, adaptando porões e garagens.

O presidente do Serviço Federal de Informações da Alemanha alertou que a Rússia pode ter condições de atacar a Europa até o final desta década, e Vladimir Putin fez declarações sugerindo a possibilidade de usar armas avançadas contra alvos na Ucrânia. Especialistas militares consideram o cenário de um ataque russo “verossímil e provável”, embora não garantido.

A OTAN intensificou apelos para que empresas europeias ajustem suas produções de modo a reduzir a dependência de países como Rússia e China.

Os motivos
A tensão que hoje cresce na Europa, que se vê no limiar de uma guerra generalizada, tem origem na reação da Rússia à expansão da OTAN até suas fronteiras. A possível adesão da Ucrânia à aliança liderada pelos EUA foi o motivo da invasão, segundo as autoridades russas. Além disso, a Rússia tenta restabelecer sua antiga zona de influência. Entre outros fatores, o conflito tem ainda a crise que escalou desde 2014, com a anexação da Crimeia pela Rússia e a ação de grupos separatistas em Donbass. Há temor de que a Rússia, num próximo passo, possa expandir suas ações para outros países vizinhos, especialmente os Estados Bálticos.

Vladimir Putin assinou um decreto em novembro de 2024 que altera a doutrina nuclear russa, flexibilizando as condições para o uso de armas nucleares ao mesmo tempo em que fez ameaças diretas contra países que fornecem armas de longo alcance à Ucrânia. A nova doutrina permite o uso de armas nucleares em resposta a ataques convencionais apoiados por potências nucleares, mesmo que não envolvam diretamente armas nucleares. Esta mudança é vista como uma resposta direta ao crescente apoio ocidental à Ucrânia, especialmente após a decisão dos EUA de permitir o uso de mísseis de longo alcance pelas forças ucranianas.

O porta-voz do Kremlin, Dmitry Peskov, afirmou que a Rússia ainda considera o uso de armas nucleares como uma “medida extrema”, mas a atualização da doutrina era necessária para refletir a situação política atual.

Comentaristas independentes consideram que uma corrida armamentista nuclear entre Rússia e Estados Unidos teria consequências potencialmente catastróficas para a segurança global e a estabilidade internacional. A volta de Donald Trump à presidência dos EUA traz preocupações quanto ao enfraquecimento da OTAN, pois os EUA podem reduzir seu compromisso com a defesa europeia.

Crise
Uma nova corrida armamentista acarretaria custos muito grandes e desviaria recursos de áreas como saúde, educação e desenvolvimento econômico. O aumento das tensões internacionais afeta negativamente o comércio global e a cooperação entre nações.

A escalada de tensões entre potências nucleares leva a uma nova guerra fria e impede a cooperação internacional. Países não diretamente envolvidos seriam forçados a tomar partido, polarizando ainda mais o cenário internacional. O primeiro-ministro polonês, Donald Tusk, disse que “a ameaça é séria e se trata de um conflito global. Todos nós sabemos, sentimos que o desconhecido está se aproximando. Nenhum de nós sabe o fim deste conflito, mas sabemos que ele está assumindo dimensões muito dramáticas no momento”, afirmou.

A OTAN mantém um arsenal de armas nucleares táticas “estacionadas” em seis países europeus, prontas para serem ativadas em caso de conflito. Há pouco, realizou exercícios de dissuasão nuclear denominados “Steadfast Noon” e conduziu na Polônia seu maior exercício militar desde a Guerra Fria, envolvendo 21.000 militares, para demonstrar preparação diante de qualquer tipo de ataque. O exercício envolveu um total de 13 países aliados, com a participação de mais de 60 aeronaves e 2.000 militares de oito bases aéreas diferentes.

O exercício incluiu caças F-35A, primeiro avião de 5ª geração com capacidade nuclear, bombardeiros, aviões de reabastecimento e aeronaves de reconhecimento e guerra eletrônica.

No dia 25/11, um representante da OTAN convocou empresas na Europa a se prepararem para um cenário de guerra e a ajustarem suas linhas de produção e distribuição. “Se pudermos garantir que todos os serviços e bens cruciais possam ser entregues, não importa o que aconteça, isso será uma parte fundamental da nossa dissuasão”, disse o presidente do comitê militar da OTAN, o almirante holandês Rob Bauer, segundo a agência Reuters. Em linguagem militar ou diplomática, essas palavras significam guerra.

Celso Japiassu

Poeta, articulista, jornalista e publicitário. Traballhou no Diário de Minas como repórter, na Última Hora como chefe de reportagem e no Correio de Minas como Chefe de Redação antes de se transferir para a publicidade, área em que se dedicou ao planejamento e criação de campanhas publicitárias. Colaborou com artigos em Carta Maior e atualmente em Fórum 21. Mora hoje no Porto, Portugal.

É autor de Poente (Editora Glaciar, Lisboa, 2022), Dezessete Poemas Noturnos (Alhambra, 1992), O Último Número  (Alhambra, 1986), O Itinerário dos Emigrantes (Massao Ohno, 1980), A Região dos Mitos (Folhetim, 1975), A Legião dos Suicidas (Artenova, 1972), Processo Penal (Artenova, 1969) e Texto e a Palha (Edições MP, 1965).