Este evento, embora tenha sido efêmero, ilustra a complexidade das relações internacionais do Brasil no início do século XIX e a importância da marinha imperial brasileira na consolidação da soberania nacional e na proteção dos interesses comerciais do país no exterior.

A presença brasileira em Cabinda está diretamente ligada ao Tratado de Paz, Amizade e Aliança, também conhecido como Tratado do Rio de Janeiro, assinado em 1825 entre Brasil e Portugal, que reconheceu a independência brasileira.

 

Esse tratado não apenas consolidou a autonomia do Brasil, mas também abriu caminho para a atuação do recém-criado Império do Brasil em outros cenários internacionais. A armada imperial brasileira, formada em grande parte pelos remanescentes da marinha portuguesa que haviam acompanhado a família real ao Brasil em 1807, foi o instrumento utilizado para proteger os interesses comerciais brasileiros em terras africanas.

 

Cabinda, um pequeno enclave no que hoje é o norte de Angola, foi escolhida como local estratégico para o estabelecimento de uma base naval brasileira. A razão para essa escolha estava relacionada à importância da costa africana como um ponto de comércio, particularmente no contexto do tráfico de escravos, que ainda era uma prática comum na época. A base naval em Cabinda tinha o objetivo de proteger as rotas comerciais brasileiras e garantir a segurança das embarcações que navegavam pelo Atlântico Sul.

 

A armada imperial brasileira, sob o comando do príncipe regente D. Pedro de Alcântara, futuro imperador D. Pedro I, foi essencial para a implementação dessa estratégia. A marinha brasileira, considerada uma das mais poderosas do mundo naquele período, desempenhou um papel crucial na defesa dos interesses do novo império. No entanto, a presença brasileira em Cabinda não durou muito. Com a abdicação de D. Pedro I em 1831 e as subsequentes mudanças políticas e econômicas que marcaram o início do Segundo Reinado, o Brasil optou por abandonar a base naval em Cabinda, encerrando assim a breve aventura colonial brasileira fora da América do Sul.

 

Essa experiência, embora curta, é significativa por diversos motivos. Primeiro, ela demonstra a capacidade do Brasil de atuar como um ator internacional independente, ainda que num cenário limitado. Segundo, revela a importância que a marinha imperial teve na proteção dos interesses econômicos e na expansão da influência brasileira durante o período imperial. Finalmente, a retirada do Brasil de Cabinda também simboliza as limitações e os desafios enfrentados pelo jovem império, que optou por concentrar seus esforços na consolidação interna em vez de manter aventuras coloniais distantes.

 

A história da presença brasileira em Cabinda é um lembrete de como o Brasil, mesmo em seus primeiros anos de independência, esteve envolvido em questões internacionais complexas. Esse capítulo esquecido da nossa história colonial reflete a ambição e as limitações do Brasil imperial e nos convida a reconsiderar a nossa visão do país como uma nação exclusivamente voltada para dentro. Ao compreender esse episódio, ampliamos nossa perspectiva sobre o papel do Brasil no cenário global durante o século XIX e sobre a formação da identidade nacional em um período de grandes transformações.

 

Por Guilherme Bitencourt 

 

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Bibliografia:

 

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Schwarcz, Lilia Moritz e Starling, Heloisa M. Brasil: Uma Biografia. São Paulo: Companhia das Letras, 2015.

 

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