Outra vez a tragicidade da Descolonização …

“Eu sei que muita gente vai contar que acha que a descolonização foi uma coisa maravilhosa. Nao foi” ( DN, Ramalho Eanes, 27.04.24 )

Para quando o direito às vozes dos Outros é a primeira questão a levantar dedo apontado aos media do status quo.

O ex-PR Eanes, homem sério, que teve o meu voto e militância por dois momentos ( sempre pela Democracia política-burguesa, mas antes ela) e que tinha o bom senso de se manter em silencio decidiu ceder à vaidade - e errar!

Comecemos pelo fait divers das suas declarações, face a jovens prontos a ouvi-lo, num tal picadeiro real ao palácio de Belem, sem que saibamos como foram esses jovens os escolhidos e não outros!

“Mas naquela altura o PCP, talvez acossado pela extrema esquerda , preparava-se efetivamente para estabelecer em Portugal um regime totalitário” ( Eanes dixit mas em nada verdade! )

a) odeio estas declarações genéricas contra uma tal “extrema esquerda”, que mistura alhos com bugalhos e esconde radicais diversidades!

Misturar no mesmo saco a UDP, a LCI, o MES, o PRP, etc, tudo organizações da “extrema esquerda” ( sem sombra de dúvidas ) a quem até foi permitido candidatarem-se às Constituintes de 1975, e que infantil, leviana e ingenuamente acreditaram que “a Revolução” era uma hipótese viável, com o PCPml/AOC, ou o PCTP/MRPP, ou a FECml de Pedro Baptista, todas também organizações da extrema esquerda ( as duas primeiras proibidas de se candidatarem às Constituintes) é mais que ofensivo alimentar uma Falsidade Histórica!

As Esquerdas à época dividiam-se em 3/4 tipos de modelos socio políticos -
a.1 as forças republicanas socialistas e autogestionárias integradas todas no PS rocardiano de Mario Soares, o verdadeiro Pai da Democracia, exceto a pequena FSP rapido desaparecida, que assumiam o modelo socio politico da então pequena Internacional Socialista, com um regime politico democrático com abertura à democracia económica social e cultural
a.2 as forças comunistas e radicais pro sovietistas ( não obrigatoriamente pro URSS ) agregando na verdade o PCP, o MDP, a LCI, o PRP, e as organizações que se fundiram na UDP/ PCr ( estas na realidade pro albanesas lideradas por uma das facções do PCdBrasil ), largamente maioritarias no campo comunista e radical
a.3 as forças comunistas e também uma parte delas radicais pro maoistas, pro PCChines, que expressa e militantemente recusavam o expansionismo sovietista como o PCPml/AOC, o PCTP/MRPP, e a FECml de Pedro Baptista e mais alguns pequenos outros grupos saídos do CMLdP/Bolchevista que assumiram publica e militantemente o combate anti social imperialista e a defesa da instauração de uma democracia política burguesa e que os levou a serem ( perdoem a vaidade ), com o PS, a linha da frente da militância cidadã pro Grupo dos 9 !

a.4 O 25 de novembro de 1975 é na realidade um pequeno contra golpe sobre um ainda mais pequeno golpe e onde o PCP não está, desde pelo menos o 11 de novembro de 1975 ( a tomada pro soviética das ex colónias portuguesas é essencialmente de Angola eram o objetivo central e único da URSS e Alvaro Cunhal aderiu a tal pro sovietista que era e por isso mesmo travou a aventura ingénua no 25.12.75!) e é sobretudo um movimento civilsta que é liderado incontestavelmente por Mário Soares!

Por isso mesmo as barricadas foram levantadas e tudo se resumiu a uma guerra páras/comandos com 3 mortos ( um deles nem pára nem comando) e o contragolpe terminou com o “sonho revolucionário” em dois dias!

Algo impensável se a revolução estivesse na verdade na ordem do dia e se o PCP estivesse na liderança desse fim de festa, o que torna ridícula a ideia de comparar o 25.04.74 com o 25.11.75!

Tratemos agora do essencial,

b) A Descolonização

E neste campo nada como afirmar ou a ignorância, ou a maldade das declarações de Ramalho Eanes!

O marechal Costa Gomes, o PR pós Spinola, viveu tanto a Abrilada de 1961 do general e ministro da Defesa Botelho Moniz como o 25.04.74 sendo afastado pelo clã Américo Tomás pouco antes do 25.04.74, e pelo MFA recuperado!

Recordemos que em agosto de 1958 Costa Gomes é nomeado subsecretário de Estado do Exército sob a liderança de Botelho Moniz, o esquecido pelas FFAA responsável pela pasta da Defesa Nacional.

A 11 / 13 de abril de 1961, Costa Gomes adere à Abrilada, ou golpe Botelho Moniz que pretendia, com os EUA iniciar um processo de Descolonização em vez de alimentar a derrocada que foram os 13 anos de guerra colonial!

Mesmo depois do “golpe” ter falhado, a 19 de abril de 1961, o então coronel Costa Gomes consegue publicar uma carta no Diário Popular que diz que o problema das províncias africanas é “um complexo de problemas do qual o militar é uma das partes que está longe de ser a mais importante”, o que leva a que na embaixada americana, se relate quev“É possível que se numa data futura as Forças Armadas acharem necessário dispensar os serviços do Dr. Salazar, o coronel Costa Gomes seja, em vez do general Botelho Moniz, a verdadeira solução”!

Durante todo o 1975 o general Costa Gomes, acusado de ‘general cortiça’, ( até no seio do PCPml ), consegue gerir os conflitos inter militares, inter civis e inter militares e civis, aos olhos de hoje, com brilho!

Coube alias a este PR do PREC a dificil tarefa de avisar a coordenadora do MFA que os EUA para apoiarem a ponte aérea, para o transporte dos chamados retornados, exigiram o afastamento do primeiro ministro Vasco Gonçalves, o que ( desculpem o termo populista) me leva a dizer “embrulhem” lá o vosso jaiminho 25.11.75 oh gentes das Direitas, e desculpe também ex PR Eanes !

A tragicidade da Descolonização resulta de:

b.1 do contra golpe salazarento ter vencido a Abrilada, pois, em 1961, o equilíbrio de forças EUA/URSS teria permitido uma Descolonização bem mais pacifica para todas as partes envolvidas
b.2 a Descolonização em moldes pacíficos teriam tornado desnecessário o retorno à pressa e em lógica de fuga dos portugueses que eram como vimos entre os retornados negros, mestiços e brancos
b.3 tal teria permitido manter o tecido económico gerado nos. 5 séculos de colonização em vez de se assistir por falta de quadros à completa desagregação do mesmo como sucedeu entre 1975 até 1992 em consequência também da guerra civil
b.3 a estruturação das forças políticas nesse processo pacifico de Descolonização teria sido bem outra com influências dominantes do cónego das Neves, de Viriato da Cruz, de Eugenio Ferreira etc em Angola, da essencial liderança de Amilcar Cabral no conjunto dos PALOP, e com a presença em Moçambique de Eduardo Mondlane
b.4 cabe pois ao regime fascista salazarento e às FFAA dominadas pelos fascistas Américo Tomas e Santos Costa, a responsabilidade do desastre inerentemente ligado ao fim do império português e tanto é assim que ainda hoje a História oficial, a civil e a militar, arruma num canto bem escuro este 11/13 de abril de 1961 quando deveria louvar o esforço e parabenizar os envolvidos!
b.5 ou a ignorância, ou a maldade é que levam o ex PR Eanes a tentar branquear a Descolonização e o papel do Fascismo nesse desastre com data marcada desde que Paulo VI deixou cair em 1970 o luso colonialismo recebendo os lideres de 3 dos movimentos de libertação das então colónias portuguesas!
b.6 Razão, Toda a Razão tiveram esses dessa “extrema esquerda” que lançaram os CLAC, os RPAC, os CLAC Vencerão, os Comités Guerra Popular, os Comités de Desertores, etc, e lembremos aqui, Francisco Rodrigues Martins, Polido Valente, Rui d’Espinay, Saldanha Sanches, Helder Costa, Vitor Ramalho, Lima Rego, Arnaldo Matos, Pedro Baptista, Pedro Ferraz de Abreu, Felix Ribeiro, Eduardo Graça, Julio Dias, entre vivos e mortos e claro os milhares que estes foram liderando no essencial Combate à Guerra Colonial que desestruturou completamente a propaganda fascista e permitiu abrir, um poucochinho, os olhos até ao ex PR Eanes !

Joffre Justino