Autocomiseração,

 

Autocomiseração,

Tão feia quanto vazia,

Pois do fado o meu quinhão

É o que veio enquanto eu ia.

Nem mais ou menos do fado

Me veio, ou a quem do lado,

P’ra sofrer o que eu sofria.

 

Se choro por mim me afogo,

Pois não escoa a tristeza;

Represo-me a dor e logo

Nela afundo com certeza.

Só se ergo as mãos a Deus,

Que conhece os filhos Seus,

É que deixo de ser presa.

 

Deixo de ser presa e caça

Do destino, que se impõe,

Do fado que a todos caça,

Que ordena e se sobrepõe.

Mas Deus é o Deus do destino,

E vejo, em meu desatino,

Que é Ele quem dispõe.

 

Ele Quem dispõe da vida,

Do destino e do meu fado;

É dele a vara comprida

Que me fere a frente e o lado.

É Ele Quem traz a dor,

E cura a chaga de amor,

Pois é nela que ele é dado.

 

Então não choro por mim,

Por minh’alma pecadora;

Por meu destino chinfrim,

Pela dor, qualquer que fora.

Choro por Ti, pois na cruz

Tomaste os erros que eu pus

Na minh’alma sofredora.

 

E então Teu amor rebrilha

E me convida a chorrir;

Então percebo que a trilha

Só foi feita p’ra seguir.

E nela vamos aos tombos,

Ralando a face e os lombos,

Esperando o que há de vir.

 

 

 

Campinas, 27 de junho de 2024

Para Nereida Manzoli