Na verdade, apesar do tipo de sistema de saúde em vigor em cada país, existe sempre uma parte dos pagamentos que é assegurada diretamente pelos cidadãos, que não é coberta pelo Estado, nem por seguros voluntários ou obrigatórios.
Segundo este estudo, da Iniciativa para a Equidade Social, uma parceria entre a Fundação La Caixa, o BPI e a Nova SBE, a despesa direta em saúde em Portugal é de 5,2% dos gastos totais das famílias.
Este valor está acima da média de 3% do conjunto dos países da OCDE e é apenas superada pela Suíça (5,5%) e pela Coreia (6,1%).
"Os pagamentos diretos em saúde podem constituir uma barreira financeira ao acesso a produtos e serviços de saúde, gerando necessidades não satisfeitas e criando dificuldades financeiras entre as pessoas que, apesar dos pagamentos diretos, conseguem aceder a serviços de saúde", avisa o relatório.
A partir da faixa dos 45-49 anos, as despesas diretas em saúde aumentam de "forma bastante expressiva", passando de 329,49 euros nesse grupo etário para os 784,04 euros no grupo entre 70-74 anos, o que corresponde a um aumento de 137,95%, realçam os investigadores.
A situação é "particularmente severa para idosos com mais de 70 anos, para os quais as despesas diretas em saúde ultrapassam 8% do rendimento líquido anual por pessoa do agregado familiar, atingindo 10,56% no conjunto de pessoas com 85 ou mais anos de idade", assume o relatório sobre o envelhecimento que "pretende contribuir para uma discussão clara e informada desta temática" em Portugal.
Entre os idosos com 65 a 69 anos, 65,30% das despesas diretas em saúde foram com medicamentos, aparelhos e material terapêutico, enquanto a segunda maior categoria de gastos é relativa a serviços médicos, paramédicos e outros serviços de saúde não hospitalares.
"A análise aqui apresentada revela que os idosos em Portugal apresentam uma grande desproteção financeira para despesas em saúde", acentua este relatório.
As mulheres, os idosos que vivem sozinhos, e os idosos de menores rendimentos e nível de escolaridade são relativamente mais afetados pelas despesas diretas em saúde, já que alocam uma maior percentagem do seu rendimento líquido a estas despesas.
Para os investigadores Pedro Pita Barros e Carolina Santos a desproteção financeira dos idosos para acomodar essas despesas diretas gera que, perante estes gastos, se "regista um agravamento da situação de pobreza, bem como um aumento da pobreza e de risco de pobreza na população idosa".
Assim, os indicadores de desproteção financeira para despesas diretas em saúde revelam uma parte das dificuldades que a população enfrenta no acesso a cuidados de saúde.
"Efetivamente, o facto de alguns agregados familiares não reportarem despesas diretas em saúde, por exemplo, não significa necessariamente que o Estado está a conseguir dar resposta às suas necessidades e que, por isso, as suas despesas diretas em saúde são nulas", indica o relatório.
Se o objetivo da sociedade for diminuir ou corrigir a "atual regressividade das despesas diretas em saúde, … (é) necessário reforçar a proteção financeira dos idosos para despesas em saúde, por exemplo através do alargamento dos apoios existentes para o acesso de grupos socioeconómicos mais desfavorecidos a cuidados de saúde".
O estudo analisa ainda a "pandemia da solidão", cujo impacto na saúde e custos associados "requerem que os sistemas de saúde priorizem estratégias de combate ao flagelo".
"Estima-se que um indivíduo de 50 anos que sofra de solidão frequentemente tem uma esperança de vida 0,37 anos (aproximadamente quatro meses) inferior à de um indivíduo que quase nunca sente solidão", refere o relatório.
Já para uma pessoa com 80 anos, é estimado que um sentimento de solidão frequente se traduza em menos 0,23 anos (aproximadamente três meses) de vida, adianta ainda o relatório, ao referir que o "impacto negativo da solidão extrema pode ser comparado ao de uma doença como o cancro ou a doença pulmonar obstrutiva crónica".
Joffre Justino