Longe de representar um simples ato de expressão política, gestos como estes remetem-nos para uma narrativa preocupante, em que a provocação se sobrepõe ao debate construtivo. A democracia permite e incentiva o dissenso, mas quando os métodos utilizados deixam de respeitar as normas que sustentam o próprio sistema democrático, o risco é evidente: a normalização de práticas que enfraquecem o Parlamento enquanto instituição.
Aqui, a metáfora da "escola" ganha força. Tal como crianças indisciplinadas que procuram atenção a qualquer custo, estas ações revelam uma tentativa de transformar o Parlamento num espetáculo mediático.
Mas a questão mais profunda emerge: quem são os “paizinhos” por trás destas atitudes? Serão os próprios cidadãos, manipulados pela retórica populista e a ilusão de respostas simples para problemas complexos? Ou serão as estruturas que, num cenário global, fomentam o radicalismo e o desrespeito pelas instituições democráticas?
As ações do partido em questão parecem beber diretamente de estratégias vistas no exterior, em regimes onde o populismo tomou de assalto a arena política. Da obstrução de debates à teatralização da política, estas táticas visam capturar a atenção dos media e, inevitavelmente, das audiências. Mas a que custo? Como alertou Hannah Arendt, “O triste facto é que a maioria do mal é feito por pessoas que nunca decidiram ser boas ou más.” Essa banalização do debate parlamentar é o primeiro passo para a erosão dos valores democráticos.
Se o Parlamento é o palco, os media são o amplificador. As ações de partidos populistas dependem de cobertura mediática para alcançar o seu objetivo: perpetuar uma narrativa de "nós contra eles". Aqui, os jornalistas enfrentam um desafio ético crucial: até que ponto devem colaborar, ainda que indiretamente, com o espetáculo?
A democracia precisa de um jornalismo crítico, que informe e eduque, em vez de alimentar o circo mediático. Não podemos esquecer que, há 50 anos, Portugal lutou para conquistar a liberdade de expressão e a pluralidade de opiniões. Respeitar este legado significa rejeitar o sensacionalismo em favor de uma análise rigorosa e fundamentada.
É imperativo que os partidos políticos, incluindo o Chega, reconheçam a responsabilidade inerente ao exercício democrático. Protestar é legítimo, mas deve ser feito dentro dos limites que a própria democracia estabelece. É um erro grave subestimar o impacto simbólico destas ações no tecido social. Elas corroem o respeito pelas instituições e legitimam, aos olhos do público, práticas que enfraquecem a democracia.
Como sociedade, cabe-nos refletir: queremos um Parlamento que funcione como um espaço de debate e construção, ou estamos dispostos a assistir passivamente à sua transformação num palco de provocações?
A democracia é um bem frágil e valioso, e a sua defesa exige vigilância constante, não apenas dos políticos, mas também dos cidadãos e dos meios de comunicação.
O populismo, quando encontra terreno fértil, transforma o extraordinário no banal e o Parlamento numa arena de espetáculo. É responsabilidade de todos — políticos, jornalistas e cidadãos — garantir que a casa do povo permaneça um símbolo de seriedade e respeito pela democracia. A liberdade, conquistada com tanto sacrifício, não pode ser reduzida a um mero jogo de audiências.
Afinal, como disse o filósofo Karl Popper, “A democracia não é um fim em si mesma, mas um meio para proteger a liberdade.” Preservar esta liberdade exige mais do que palavras — exige ações responsáveis e comprometidas.