Nenhuma das duas medidas está prevista no decreto que regulamenta o atual estado de emergência.
Apesar do projeto de decreto presidencial renovar o estado de emergência e voltar a permitir o confinamento compulsivo de pessoas infetadas ou em vigilância ativa, assim como o encerramento total ou parcial de estabelecimentos, serviços e empresas a verdade é que as orientações e os discursos dos poderes continuam a fugir ao real : para limitar a convivência há que limitar a convivência nos transportes e nos locais de trabalho de onde ocorre uma boa parte da infeção que se transporta para a família e as relações de amizade.
Isto é – alargar a variação das horas de entrada e saída na atividade económica e social; reduzir o período semanal de trabalho generalizadamente, e impor nas empresas e organizações da economia e do social as legais ( mesmo que quase inexistentes) Comissões de Higiene Saude e Segurança no Trabalho
Também incentivar as lógicas de cooperação inter empresas e organizações
Está parcialmente suspenso o exercício dos direitos à liberdade e de deslocação, permitindo-se, “na medida do estritamente necessário e de forma proporcional, o confinamento compulsivo em estabelecimento de saúde, no domicílio ou, não sendo aí possível, noutro local definido pelas autoridades competentes, de pessoas portadoras do vírus SARS-CoV-2, ou em vigilância ativa“.
O projeto de decreto do Presidente da República limita também o exercício da iniciativa privada, social e cooperativa, estabelecendo que “pode ser determinado pelas autoridades públicas competentes o encerramento total ou parcial de estabelecimentos, serviços, empresas ou meios de produção e impostas alterações ao respetivo regime ou horário de funcionamento“.
Nem o confinamento compulsivo nem o encerramento de estabelecimentos estão previstos no decreto do estado de emergência atualmente em vigor, que se aplica à quinzena entre 9 e 23 de novembro, mas estavam contemplados nos anteriores decretos, de 18 de março, 2 de abril e 17 de abril.
Se a renovação deste quadro legal agora proposta pelo Presidente da República for aprovada pelo parlamento, o estado de emergência vigorará de 24 de novembro até 08 de dezembro.
DECRETO DO PRESIDENTE DA REPÚBLICA No /2020
A evolução da pandemia COVID-19 e a tomada de medidas sanitárias indispensáveis para lhe fazer face mostram que restrições ao contacto entre pessoas reduzem o risco de contágio e de propagação do vírus.
Algumas dessas medidas, pela sua gravidade e potencial lesão de direitos, liberdades e garantias, exigem constitucionalmente a declaração do estado de emergência.
Os peritos indicam que o efeito das medidas tomadas sobre a evolução da pandemia se fazem sentir, no número de infetados, cerca de duas a seis semanas depois de serem tomadas, e, no número de falecimentos, cerca de um mês depois.
, bem como uma pequena desaceleração da taxa de crescimento da incidência.
No entanto, este nível de incidência, com os muito inquietantes números de novos infetados e de falecimentos, continua a ser muito elevado e a colocar uma enorme pressão no SNS e no sistema de saúde em geral, em particular na capacidade de acolhimento em Unidades de Cuidados Intensivos, pelo que, para além das medidas genéricas e fundamentais de higiene pessoal, de uso adequado de máscaras e de distanciamento social, é indispensável renovar o estado de emergência, para que certas medidas restritivas possam ser também renovadas, mas mais adaptadas à experiência da realidade e mais diferenciadas em função da situação e heterogeneidade em cada município, esperando-se que possam em breve produzir efeitos positivos.
Para esta diferenciação, serão certamente úteis os critérios permitindo o agrupamento de níveis risco, definidos pelo Centro Europeu de Controlo de Doenças.
Acresce que a janela de esperança que é aberta pelas novas vacinas só se poderá começar a concretizar, se tudo correr como previsto, a partir de janeiro de 2021 e a vacinação de todos os interessados levará necessariamente vários meses.
Nestes termos, o Presidente da República decreta, nos termos dos artigos 19.o, 134.o, alínea d), e 138.o da Constituição e da Lei n.o 44/86, de 30 de setembro, alterada pela Lei Orgânica n.o 1/2011, de 30 de novembro, e pela Lei Orgânica n.o 1/2012, de 11 de maio, sob proposta e ouvido o Governo e obtida a necessária autorização da Assembleia da República, através da Resolução da Assembleia da República n.o (…), de 20 de novembro, o seguinte:
1.o
A declaração do estado de emergência é renovada por igual período de 15 dias, com fundamento na verificação de uma situação de calamidade pública.
2.o
A declaração do estado de emergência abrange todo o território nacional, sem prejuízo do disposto na alínea a), do número 1, do artigo 4.o.
3.o
A renovação do estado de emergência inicia-se às 00h00 do dia 24 de novembro de 2020 e cessa às 23h59 do dia 8 de dezembro de 2020, sem prejuízo de eventuais renovações, nos termos da lei.
4.o
Durante todo o período referido no artigo anterior, fica parcialmente suspenso o exercício dos seguintes direitos, nos estritos termos seguidamente previstos:
1) Direitos à liberdade e de deslocação:
a) Nos municípios com níveis mais elevados de risco, podem ser impostas restrições necessárias para reduzir o risco de contágio e executar as medidas de prevenção e combate à epidemia, devendo as medidas a adotar ser calibradas em função do grau de risco de cada município, podendo, para este efeito, os mesmos ser agrupados de acordo com os dados e avaliação das autoridades competentes, incluindo a proibição de circulação na via pública durante determinados períodos do dia ou determinados dias da semana, bem como a interdição das deslocações que não sejam justificadas nos termos da alínea c).
b) Na medida do estritamente necessário e de forma proporcional, o confinamento compulsivo em estabelecimento de saúde, no domicílio ou, não sendo aí possível, noutro local definido pelas autoridades competentes, de pessoas portadoras do vírus SARS-CoV-2, ou em vigilância ativa.
c) As restrições referidas supra na alínea a) devem prever as regras indispensáveis para a obtenção de cuidados de saúde, para apoio a terceiros, nomeadamente idosos, incluindo acolhidos em estruturas residenciais, para a frequência de estabelecimentos de ensino, para a produção e abastecimento de bens e serviços e para a deslocação por outras razões ponderosas, cabendo ao Governo, nesta eventualidade, especificar as situações e finalidades em que a liberdade de circulação individual, preferencialmente desacompanhada, se mantém.
2) Iniciativa privada, social e cooperativa:
a) Podem ser utilizados pelas autoridades públicas competentes, preferencialmente por acordo, os recursos, meios e estabelecimentos de prestação de cuidados de saúde integrados nos setores privado, social e cooperativo, mediante justa compensação, em função do necessário para assegurar o tratamento de doentes com COVID-19 ou a manutenção da atividade assistencial relativamente a outras patologias.
b) Podem ser adotadas as medidas adequadas e indispensáveis para garantir as condições de normalidade na produção, transporte, distribuição e abastecimento de bens e serviços essenciais à atividade do setor da saúde, designadamente com vista a assegurar o acesso e a regularidade no circuito dos medicamentos e vacinas, dos dispositivos médicos e de outros produtos de saúde, como biocidas, soluções desinfetantes, álcool e equipamentos de proteção individual.
c) Pode ser determinado pelas autoridades públicas competentes o encerramento total ou parcial de estabelecimentos, serviços, empresas ou meios de produção e impostas alterações ao respetivo regime ou horário de funcionamento.
3) Direitos dos trabalhadores:
a) Podem ser mobilizados, pelas autoridades públicas competentes e no
respeito dos seus restantes direitos, trabalhadores de entidades públicas, privadas, do setor social ou cooperativo, independentemente do respetivo tipo de vínculo ou conteúdo funcional e mesmo não sendo profissionais de saúde, designadamente servidores públicos em isolamento profilático ou abrangidos pelo regime excecional de proteção de imunodeprimidos e doentes crónicos, para apoiar as autoridades e serviços de saúde, nomeadamente na realização de inquéritos epidemiológicos, no rastreio de contactos e no seguimento de pessoas em vigilância ativa.
b) Pode ser limitada a possibilidade de cessação dos vínculos laborais dos trabalhadores dos serviços e estabelecimentos integrados no SNS.
4) Direito ao livre desenvolvimento da personalidade e vertente negativa do direito à saúde: pode ser imposta a utilização de máscara e a realização de controlos de temperatura corporal, por meios não invasivos, assim como a realização de testes de diagnóstico de SARS-CoV-2, designadamente para efeitos de acesso e permanência no local de trabalho ou como condição de acesso a serviços ou instituições públicas, estabelecimentos de ensino ou de formação profissional e espaços comerciais, culturais ou desportivos, na utilização de meios de transporte ou relativamente a pessoas institucionalizadas ou acolhidas em estruturas residenciais, estabelecimentos de saúde, estabelecimentos prisionais ou centros educativos e respetivos trabalhadores.
5) Direito à proteção de dados pessoais: pode haver lugar ao tratamento de dados pessoais na medida do estritamente indispensável para a concretização das medidas previstas no n.o 3 do presente artigo e no artigo 5.o do presente decreto, bem como para efeitos do disposto no n.o 4 do presente artigo sem que, neste caso, seja possível guardar memória ou registo das medições de temperatura corporal efetuadas nem dos resultados dos testes de diagnóstico de SARS-CoV-2.
5.o
Compete às Forças Armadas e de Segurança apoiar as autoridades e serviços de saúde, designadamente na realização de inquéritos epidemiológicos, no rastreio de contactos e no seguimento de pessoas em vigilância ativa. Podem igualmente ser mobilizados os recursos, meios e estabelecimentos de prestação de cuidados de saúde das Forças Armadas e de Segurança no apoio e reforço do Serviço Nacional de Saúde.
6.o
A execução da declaração do estado de emergência compete ao Governo, que dos respetivos atos manterá informados o Presidente da República e a Assembleia da República.
7.o
O presente Decreto entra imediatamente em vigor, produzindo efeitos nos termos definidos no artigo 3.o.
Assinado em 20 de novembro de 2020. Publique-se.
O PRESIDENTE DA REPÚBLICA
Referendado em 20 de novembro de 2020
O PRIMEIRO-MINISTRO